Epistemological Circle in Information Science through University Extension
Círculo Epistemológico en Ciencias de la Información a través de la Extensión Universitaria
Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
mendesedlu@gmail.com.br https://orcid.org/0000-0003-4740-2712
Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
marcelo.minghelli@ufsc.br https://orcid.org/0000-0002-5964-2441
Universidade Federal de Viçosa, Brasil
cezar.demari@ufv.br https://orcid.org/0000-0003-0404-0328
MENDES, Edson Luiz; MINGHELLI, Marcelo; DEMARI, Cezar. Círculo Epistemológico na Ciência da Informação por meio da Extensão Universitária. REBECIN, São Paulo, v. 10, p. 01-27, 2023. DOI: 10.24208/rebecin.v10.369
Este trabalho analisa os vínculos virtuosos entre a universidade e espaços sociais vulneráveis, na cidade de Florianópolis, SC, em atividades com jovens, por meio da pedagogia do Círculo Epistemológico, embasado no Círculo de Cultura freiriano. O objeto de estudos foi o Programa Cibercidadania, do Curso de Ciências da Informação
- CIN/UFSC, conduzido por uma equipe interdisciplinar desenvolvido em duas comunidades empobrecidas do Maciço do Morro da Cruz, Monte Serrat e Alto da Caieira. A metodologia foi composta por Círculo Epistemológico, entrevistas semiestruturadas e aplicação de questionário aos jovens participantes do Programa. Os dados coletados foram fundamentais na identificação da relevância social e produção de conhecimento por meio do Programa, confirmando que o fazer científico mediado pelo diálogo perpassa pela mobilização de novas perguntas e respostas em direção à conscientização. Conclui-se que o processo de aprendizagem foi de ambos os lados, permitindo o acesso desses jovens a um conjunto de informações e conhecimentos, e à universidade, aprendizagem com a mediação da metodologia do Círculo Epistemológico.
This work analyzes the virtuous links between the university and vulnerable social spaces, in the city of Florianópolis, SC, in activities with young people, through the pedagogy of the Epistemological Circle, based on the Freirian Culture Circle. The object of study was the Cybercitizenship Program, of the Information Sciences Course
- CIN/UFSC, conducted by an interdisciplinary team developed in two impoverished communities in Maciço do Morro da Cruz, Mont Serrat and Alto da Caieira. The methodology was composed of an Epistemological Circle, semi-structured interviews and questionnaire application to young people participating in the Program. The data collected was fundamental in identifying the social relevance and production of knowledge through the Program, confirming that scientific practice mediated by dialogue involves the mobilization of new questions and answers towards awareness. It is concluded that the learning process went both ways, allowing these young people access to a set of information and knowledge, and to the university, learning through the mediation of the Epistemological Circle methodology.
Este trabajo analiza los vínculos virtuosos entre la universidad y espacios sociales vulnerables, en la ciudad de Florianópolis, SC, en actividades con jóvenes, a través de la pedagogía del Círculo Epistemológico, basado en el Círculo de Cultura Freiriana. El objeto de estudio fue el Programa de Ciberciudadanía, del Curso de Ciencias de la Información - CIN/UFSC, realizado por un equipo interdisciplinario desarrollado en dos
comunidades empobrecidas de Maciço do Morro da Cruz, Mont Serrat y Alto da Caieira. La metodología estuvo compuesta por un Círculo Epistemológico, entrevistas semiestructuradas y aplicación de cuestionarios a los jóvenes participantes del Programa. Los datos recolectados fueron fundamentales para identificar la relevancia social y la producción de conocimientos a través del Programa, confirmando que la práctica científica mediada por el diálogo implica la movilización de nuevas preguntas y respuestas hacia la concientización. Se concluye que el proceso de aprendizaje fue en ambos sentidos, permitiendo a estos jóvenes acceder a un conjunto de información y conocimientos, y a la universidad, aprendiendo a través de la mediación de la metodología del Círculo Epistemológico.
Em pleno século XXI as questões relacionadas à informação e ao seu fluxo são cada vez mais compreendidas na sua mobilização, efetivação e influência social. Crescem as áreas do conhecimento que se debruçam sobre esse fenômeno, considerando seu impacto de maneira veloz, instantânea e cotidiana no pensamento e na ação coletiva.
A sociedade vem sendo influenciada pela utilização de vários fluxos informacionais, por meio de diversos mecanismos tecnológicos que produzem significados e sentidos de vida, cujos resultados podem ser medidos pela adesão aos acessos, compartilhamentos e manuseios constantes, onde o envolvimento cotidiano dos cidadãos (usuários), acontece de maneira fluida e praticamente imperceptível de autorreflexão crítica. Esse processo não ocorre sem consequências, especialmente porque “o Estado e a economia passaram a atuar mais densamente na elaboração e refinamento de diversos mecanismos de controle das liberdades.” (Gomes, 2017 apud Gomes; Novo, 2017, p. 32).
A informação é um objeto de estudo contemporâneo, tratado como um direito universal, onde a Ciência da Informação com abertura interdisciplinar integradora, articulada entre várias áreas do conhecimento científico, envolve e investiga propriedades, comportamentos, meios de processamentos e forças que regem o fluxo da informação (Marques; Gomes, 2020). Ao delimitar um objeto de estudo, a Ciência da Informação apresenta-se como ciência social que:
investiga os problemas, temas e casos relacionados com o fenómeno info-comunicacional perceptível e cognoscível através da confirmação ou não das propriedades inerentes à génese do fluxo, organização e comportamentos informacionais (Pombo, 2003 e 2004 apud Marques; Gomes, 2020, p. 8).
Confluindo várias disciplinas, a Ciência da Informação interage com a educação na busca de possibilitar à sociedade, o acesso aos conhecimentos construídos historicamente pela humanidade.
Ciente de que “a sociedade capitalista se sustenta na acumulação de capital. Não de um capital coletivo, mas de um capital individual,” (Almeida Júnior, 2017 apud Gomes; Novo, 2017, p. 54), a educação influencia a transformação social por meio da conscientização a partir do acesso ao conhecimento e sua contextualização com a realidade, possibilitando a emancipação.
Assim, é necessário expandir suas bases, para que não só abranjam o ensino e a pesquisa, mas também favoreçam o desenvolvimento intelectual dos sujeitos sociais, fortalecendo também a interatividade entre a instituição e a comunidade. (Jesus; Gomes, 2021, p. 03).
A partir do ensino, pesquisa e extensão a universidade produz, acompanha, cria, recria e dissemina conhecimentos que contribuem e impactam na cultura e organização da sociedade. Nesse sentido, a
extensão universitária é primordial na emancipação de sujeitos, pois junto da educação, “a ação cultural dá condições para que o sujeito faça escolhas, para que não seja um mero consumidor cultural”. (Almeida Júnior, 2017 apud Gomes; Novo, 2017, p. 56). A Articulação entre a comunidade acadêmica e a comunidade externa, por meio de trocas recíprocas pode promover um processo educativo cultural e científico, que chegando à conscientização, viabiliza a transformação do território e da sociedade, incluindo o próprio mundo acadêmico.
A conexão que se estabelece entre esses dois polos é uma relação de trocas, em que a universidade [...] oferece subsídios para um desenvolvimento intelectual dos sujeitos, [...] a comunidade contribui com seus valores e cultura.” (Jesus; Gomes, 2021, p. 03).
A universidade exerce um papel determinante no crescimento científico e cultural. As contradições que nela residem são as mesmas que encontramos na sociedade, por isso as disputas sobre seu papel formativo e universal vêm avançando, no Brasil, a partir do início do século XX1. A extensão universitária, nos últimos 30 anos, avançou tanto em termos da compreensão da realidade social, quanto na necessidade de seu desenvolvimento para fora dos muros da universidade. Apesar das evidências cada vez mais significativas de sua importância na formação dos graduandos e da sociedade, a extensão universitária ainda possui a maioria de suas ações nos espaços físicos internos das próprias
1 Em 7 de setembro de 1920, por meio do Decreto n.º 14.343, o governo federal criou sua primeira universidade: a Universidade do Rio de Janeiro (URJ). Disponível em: https://ufrj.br/acesso-a- informacao/institucional/historia/#:~:text=Em%207%20de%20setembro%20de,Rio%2 0de%20Janeiro%20(URJ). Acesso em: 09 dez. 2023.
instituições2, onde o foco e metodologia utilizada perpassa pela transmissão de conhecimentos e não como troca de saberes que podem levar ao protagonismo social consciente.
A possibilidade de ser protagonista, a partir de suas premissas educacionais e culturais, em uma ação na sua comunidade promove o fortalecimento dos sujeitos envolvidos por meio de relações sociais. A participação enquanto sujeito ativo em metodologias político-pedagógicas dialógicas e democráticas são potencializadoras do processo de ensino- aprendizagem para uma nova leitura e a ressignificação de todos os envolvidos. (Freire, 2011).
A extensão universitária está entre as possibilidades de intervenção voltadas à participação cidadã para desmistificar a impossibilidade de ruptura da situação social, na direção contrária do que historicamente se tem dito “às maiorias, em dificuldades até de sobreviver [...] que a realidade é assim mesma [...]” (Freire, 2011, p. 99). A extensão consegue chegar com a ciência nos locais mais distantes e vulneráveis da sociedade. Por meio da educação, dialoga com a cultura local buscando sua emancipação.
Outro saber de que não posso duvidar um momento sequer na minha prática educativo-crítica é o de que como experiência especificamente humana, a educação é uma forma de intervenção no mundo. Intervenção que, além do conhecimento dos conteúdos bem ou mal ensinados e/ou aprendidos, implica tanto o esforço de reprodução da ideologia dominante quanto o seu desmascaramento. (Freire, 2011, p. 96).
A extensão universitária na comunidade em situação de vulnerabilidade social busca cercar-se de metodologias com abordagens
2 Entre os artigos publicados na base de dados BRAPCI entre 2017 e 2021, apenas 16% foram realizados em comunidades externas à universidade, enquanto 84% aconteceram no seu interno. (Mendes, 2023, p. 49).
participativas por meio de técnicas e ferramentas de coleta de dados que ajudem a pesquisa e ao mesmo tempo, a transformação social, ou seja, “contra toda a força do discurso fatalista neoliberal, pragmático e reacionário, insisto hoje, sem desvios idealistas, na necessidade de conscientização”. (Freire, 2011, p. 54). Assim, a maneira como se concretiza a mediação de conhecimentos entre os sujeitos da universidade e da comunidade é de fundamental importância e significado em um processo emancipatório, na perspectiva de que “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção.” (Freire, 2011, p. 47).
Por isso, o objetivo neste diálogo é apresentar e provocar reflexões acerca da importância do Círculo Epistemológico em ações de extensão universitária realizadas em comunidades de periferias, a partir da experiência do Programa Cibercidadania registrada na dissertação de mestrado intitulada, A Extensão Universitária na Ciência da Informação: análise do programa Cibercidadania, onde buscou-se identificar os impactos sociais e analisar a produção do conhecimento desenvolvida pelo Programa, entre 2017 e 2021. A metodologia utilizada é qualitativa por meio da revisão de literatura e análise dos resultados da referida dissertação, na perspectiva de uma prática emancipadora proporcionada pelo Círculo Epistemológico.
O Círculo Epistemológico também conhecido como Círculo Cultural3 sistematizado por Paulo Freire é compreendido como uma prática
3 Os Círculos de Cultura surgiram no Brasil e na América Latina a partir do final dos anos 1950 e início dos anos 1960. Sistematizados por Paulo Freire, foram compreendidos como uma prática pedagógica democrática e libertadora, em oposição às práticas bancárias largamente difundidas no contexto da educação brasileira. Parte-se do pressuposto de que todas as pessoas possuem uma forma
democrática interdisciplinar que considera todos os participantes com saberes significativos a partir de suas experiências de vida, e, por isso é uma prática libertadora que se contrapõem as metodologias conhecidas como bancárias, onde os participantes seguem um roteiro fechado e sem a possibilidade de demonstrarem seus pensamentos verdadeiros. (Coelho; De Mari, 2013 apud Mendes, 2023). O Círculo Epistemológico fundamenta-se no Círculo de Cultura freiriano.
De forma mais objetiva, podemos dizer que os Círculos Epistemológicos são espaços democráticos e interpretativos utilizados no fazer investigativo. O/a pesquisador/a que o utiliza é provocado/a a romper com representações naturalizadas de que somente ele/a teria um conhecimento capaz de compreender a realidade analisada.”. (Accorssi; Clasen; Veiga Júnior, 2021, p. 5).
A metodologia qualitativa utilizada na dissertação foi desdobrada em dois momentos distintos e articulados: a) pesquisa bibliográfica mapeando a quantidade de artigos publicados sobre a extensão universitária em comunidades e; b) pesquisa de campo com análise de documentos escolares e entrevistas com estudantes, por meio do Círculo Epistemológico.
O Programa Cibercidadania faz parte da implementação curricular da extensão universitária do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Federal de Santa Catarina - CIN/UFSC, e interage com a comunidade de periferia denominada Monte Serrat, localizada no Maciço do Morro da Cruz, em Florianópolis, por meio de parceria com o Ensino Médio da instituição Marista Escola Social Lucia Mayvorne, desde 2017. (Mendes, 2023).
Para o CIN/UFSC evidencia-se a prática de extensão participativa, onde de maneira interdisciplinar e democrática, o distanciamento existente entre mundo acadêmico e comunidade
própria de saber, sendo que esse saber tem em si valor, uma vez que representa experiências de vida. (Accorssi; Clasen; Veiga Júnior, 2021, p. 2).
de periferia, entre conhecimento científico e conhecimento popular, pode ser menor por meio da busca do protagonismo, da emancipação e da transformação social, contribuindo para um mundo mais sustentável e igualitário, mesmo com todos os desafios que estão surgindo nessa sociedade da informação. (Mendes, 2023, p. 40).
A partir desta introdução contextualizadora, dialogamos com a literatura acerca da mediação do conhecimento por meio da extensão universitária, nessa sociedade da informação permeada por meandros capitalistas. Na sequência dialogamos com os resultados da dissertação, na perspectiva da prática emancipadora proporcionada pela utilização do Círculo Epistemológico como uma possibilidade metodológica de pesquisa científica significativa para as comunidades de periferia, com a intenção de desenvolver a consciência crítica e o protagonismo social. E finalizamos considerando a presença do Círculo Epistemológico dissertação, bem como sua fundamentação freiriana no Programa Cibercidadania.
O sistema capitalista inverte a realidade ao colocar os interesses da minoria como se fossem comuns de todo o cidadão, se utilizando dos mais variados mecanismos de informações. O propósito disso é afastar qualquer possibilidade de reações, criando-se “barreira, obstáculo ao protagonismo social das classes populares”. (Almeida Júnior, 2017 apud Gomes; Novo, 2017, p. 55). Produção, consumo, mercadoria e acúmulo de capital direcionam a estrutura social vigente, onde a competitividade e o individualismo se concretizam como finalidades. A população vulnerável vai sendo induzida a incorporar a cultura atomizada pelo consumo de
massa. “A mercadoria cria necessidades que não existiam e as assumimos e as incorporamos em nosso cotidiano” (Almeida Júnior, 2017 apud Gomes; Novo, 2017, p. 55), por isso a necessidade de uma ação educacional e cultural que promova a compreensão e a superação deste fenômeno. As resistências se constroem por meio de enfrentamentos coletivos às imposições de uma determinada hegemonia.
Apenas a resistência pode quebrar ou minimizar a imposição de formas de vida que atendem apenas a determinados grupos, apenas a concepções hegemônicas. O protagonismo só se faz presente como fruto de resistência, como forma de consciência, mesmo que não plenamente, das formas de dominação presentes na sociedade capitalista. (Almeida Júnior, 2017 apud Gomes; Novo, 2017, p. 56).
Nos últimos anos, têm-se ampliado os estudos acerca da informação e sua influência na sociedade. A divulgação e a produção de conhecimentos por instituições públicas junto à população têm sido aliadas estratégicas na mudança social. A sociedade vem aprendendo que as informações divulgadas incansavelmente pelos meios corporativos, acompanhadas e fortalecidas por determinadas organizações sociais, estão carregadas de interesses privados e na manutenção de uma consciência ingênua da realidade. Nesse sentido Pedro Demo (2020) afirma que:
É imbecilizante no sentido de que nos tolhe a visão crítica, fazendo-nos crer que a maneira mais atraente de dar notícia é a própria. Desfaz seu caráter disruptivo, induzindo-nos à acomodação. Outros noticiários também são manipulativos, por certo, mas podem, em seu contraponto, conclamar algo de espírito crítico e, quando menos, não ser tão manipulativos. No pano de fundo de todos, tremula a bandeira certa do mercado: notícia de verdade é aquela que vende. (Demo, 2000, p. 40).
Os retrocessos dos últimos anos nos âmbitos: social, ambiental, constitucional e dos direitos humanos; acenam à necessidade de
envolvimento por parte de todas as esferas sociais, em favor de direitos universais e de justiça. A extensão universitária se coloca como uma destas mediações por ter a capacidade de alcançar o interior das comunidades empobrecidas socialmente. “Nesse sentido, compreende- se aqui a informação como conhecimento em estado de compartilhamento, que se caracteriza como produto do esforço de colocar em comum”. (Gomes, 2017 apud Gomes; Novo, 2017, p. 31).
Os avanços tecnológicos que caracterizam a “Sociedade da Informação” podem ser conduzidos tanto para a emancipação quanto para a manipulação dos sujeitos. Em pleno século XXI ressurgem, com força, ações antidemocráticas servindo-se de instrumentos informacionais, para excluir, fazendo-nos refletir sobre a necessidade de fortalecimento das intervenções pedagógicas utilizadas nos espaços educacionais.
Diante de uma sociedade cada vez mais digitalizada, conectada e em direção de um mundo cibernético, robotizado e artificial, “não há como deixar de refazer caminhos, mesmo se alguns segmentos socioculturais julguem corriqueiros os fazeres informacionais da atualidade.” (Perrotti; Pieruccini, 2007 apud Lara; Fujino; Noronha, 2007, p. 52). Faz-se necessário possibilitar que o conhecimento científico alcance os lugares mais longínquos, discriminados e silenciados. Nesse processo de transformação cultural as comunidades em situação de vulnerabilidade são pontos centrais de atuação de diversas frentes e interesses, desde os grupos e instituições que buscam seu crescimento, quanto os que almejam sua submissão aos interesses de grupos externos.
A relação entre mediação e protagonismo cultural será tratada a partir de aspectos ligados à problemática do silenciamento das vozes sociais, fenômeno que afeta de modo contundente a
condição de participação democrática, crítica e criativa dos sujeitos na cultura. (Pieruccini, 2017 apud Gomes; Novo, 2017, p. 59).
Por isso a importância da educação emancipadora mediada pela extensão universitária: a ação cultural que transforma pessoas e “pode possibilitar ao sujeito tomar as rédeas da ação, tornando-o, mesmo que de maneira não plena, protagonista de suas relações e entendimento do mundo.” (Almeida Júnior, 2017 apud Gomes; Novo, 2017, p. 56). Consequentemente as pessoas ao buscarem a transformação de suas realidades também se modificam, incorporando valores coletivos e novas práticas sociais.
Nessa direção, a experiência do Círculo Epistemológico, onde todos são pesquisadores e pesquisados, “ou seja, os lugares de análise e de enunciação circulam no grupo”, (Accorssi; Clasen; Veiga Júnior, 2021, p. 5), proporcionada por meio de estudo sobre o Programa Cibercidadania, tem buscado oportunizar situações de aprendizagens, tanto aos jovens das comunidades quanto aos graduandos envolvidos, ampliando o campo de percepção acerca da organização da sociedade atual. “Tal posicionamento está baseado na premissa freiriana de que não há um/a que sabe mais do que outro/a; há, sim, saberes diferentes produzidos em contextos também diversos.” (Accorssi; Clasen; Veiga Júnior, 2021, p. 5). O Programa tem encontrado em Paulo Freire (2011), referência,
fortalecimento e fundamentação:
O fato de me perceber no mundo, com o mundo e com os outros me põe numa posição em face do mundo que não é de quem nada tem a ver com ele. Afinal, minha presença no mundo não é a de que a ele se adapta, mas a de que nele se insere.” (Freire, 2011, p. 53).
O processo de análise e compreensão das opressões possibilita a superação de mitos e crenças, oportunizando aos jovens um posicionamento consciente na transformação de sua realidade. “Processo que implica em atividade, movimento, tomada de posição e consequente manifestação de oposições, demandando o nascimento e o exercício do protagonismo social.” (Gomes, 2017 apud Gomes; Novo, 2017, p. 32).
A extensão universitária tem chegado com a ciência nos locais mais distantes e vulneráveis da sociedade, em territórios como Monte Serrat e Alto da Caieira, comunidades localizadas no centro da cidade de Florianópolis/SC. A aproximação com esses espaços é baseada no diálogo, troca de saberes e, no desenvolvimento de metodologias participativas, porque "ninguém, numa perspectiva democrática, deveria ensinar o que sabe, sem de um lado, saber o que já sabem e em que nível sabem aqueles e aquelas a quem vai ensinar o que sabe”. (Freire, 2011, p. 131). A concepção de educação freiriana, com centralidade nos Círculos Epistemológicos têm contribuído para a aprendizagem da equipe universitária, melhorando o entendimento do valor desta pedagogia/metodologia para atuação junto às populações de periferia.
Na construção deste artigo é utilizado a metodologia qualitativa por meio da revisão de literatura e análise crítico-interpretativa dos resultados da dissertação que analisa o Programa Cibercidadania entre 2017 e 2021. Esse texto trata da utilização do Círculo Epistemológico em uma pesquisa qualitativa com abordagem crítico-interpretativa, realizada com jovens em comunidade de periferia, por meio da extensão universitária. A
dinâmica utilizada na coleta de dados foi o Círculo Epistemológico, que tem sua base no círculo de cultura freireano, por meio de entrevistas com questionário orientador semiestruturado. No Círculo de Cultura “parte-se do pressuposto de que todas as pessoas possuem uma forma própria de saber, sendo que esse saber tem em si valor, uma vez que representa experiências de vida.” (Accorssi; Clasen; Veiga Júnior, 2021, p. 2).
A opção por essa metodologia se deu por dois motivos distintos e conectados: a) necessidade de aproximação com o público entrevistado, que já tem desenvolvido o costume da roda de bate papo para explanar suas ideias e opiniões sobre assuntos de seu cotidiano; b) pela qualidade na veracidade nas informações coletadas, acompanhadas da conscientização que as dinâmicas pautadas no diálogo, possibilitam. “Dessa maneira, a práxis educativa ultrapassa a noção de pesquisa tradicional e tem papel conscientizador daqueles/as que participam dos Círculos.” (Accorssi; Clasen; Veiga Júnior, 2021, p. 7).
O público são os estudantes de ensino médio matriculados entre 2017 a 2021, totalizando 477 estudantes, da unidade escolar Marista Escola Social Lucia Mayvorne, situada na comunidade Monte Serrat, no Maciço do Morro da Cruz, no município de Florianópolis-SC, a partir da parceria entre escola e universidade, com o Programa de Extensão Cibercidadania do Departamento de Ciências da Informação (CIN/UFSC). Num primeiro momento, em pesquisa de mestrado intitulada "A Extensão Universitária na Ciência da Informação: análise do programa Cibercidadania", buscou-se identificar os impactos sociais e analisar a produção do conhecimento desenvolvida pelo Programa, entre 2017 e 2021. A metodologia foi desdobrada em dois momentos distintos e articulados: a) pesquisa bibliográfica mapeando a quantidade de artigos
publicados sobre a extensão universitária em comunidades e; b) pesquisa de campo com análise de documentos escolares e entrevistas com estudantes.
As entrevistas se deram nos mesmos espaços onde ocorreram as dinâmicas do Círculo Epistemológico. O Quadro abaixo explica os procedimentos realizados para coletar os dados acerca da quantidade de publicações sobre a extensão universitária entre 2017 e 2021; para coletar informações sobre a situação em que se encontram os estudantes que participaram no Programa Cibercidadania.
ONDE | O QUE | COMO |
Plataforma BRAPCI (Base de Dados Referenciais de Artigos de Periódicos em Ciência da Informação) | Mapear a quantidade de publicações sobre a extensão universitária entre 2017 e 2021, considerando: | Descritores: |
Entrevistas com Estudantes | Averiguar status real dos estudantes que participaram no Programa Cibercidadania: | Por meio de Círculo Epistemológico em encontro único com três momentos distintos: |
temáticas
áreas afins
local de realização.
extensão universitária
projeto extensionista
extensão universitária comunitária
dez estudantes com acesso ao ensino superior;
dez estudantes com acesso a cursos profissionalizantes e/ou ao mercado de trabalho
grande roda
pequenos grupos
individual
O Quadro 1 apresenta os procedimentos realizados, enfatizando onde, o que e como foram coletados os dados informacionais. A amostragem é de 21% para as entrevistas, totalizando vinte estudantes egressos do ensino médio que participaram do Programa Cibercidadania e estão cursando o nível superior ou cursos profissionalizantes, ou ainda
apenas estão atuando no mercado de trabalho. A entrevista aconteceu em encontro único, na biblioteca da Escola, com ambientação de uma roda de cadeiras, uma mesa composta de quitutes para café da tarde, acompanhado de fotos e vídeos com atividades que os estudantes realizaram no Programa.
No grupo, não há alguém que tudo saiba, mas cada participante pode contribuir com uma parcela do conhecimento, somando e dividindo suas perspectivas teórico-práticas e prático-teóricas. Nesse contexto, discutem-se ideias e práticas, no limite e na condição de cada sujeito ali envolvido. Trata-se de uma atividade que é interdisciplinar por princípio, por abranger as diversas facetas das áreas do conhecimento humano. (Coelho; De Mari, 2013, p. 41).
Com o objetivo de compreender se o Programa Cibercidadania havia impactado significativamente nas tomadas de decisões para efetivação de seus projetos de vida, foi organizado o encontro em três momentos contínuos e conectados, conduzida por uma pessoa mediadora que se orientou por questionário semiestruturado.
O Quadro 2 traz as perguntas orientadoras de cada questionário, que serviram de estimuladores à verbalização de suas opiniões e considerações.
Questionário para grande grupo | Questionário para pequeno grupo | Questionário Individual |
1.Após a finalização do ensino médio continuou ou continua estudando? estudos? Por quê? | 1.Qual a importância do Programa Cibercidadania na construção do seu projeto de vida, durante sua vida estudantil no ensino médio? | 1.Qual maior contribuição do Programa Cibercidadania, para você? |
se sim: o que está estudando ou cursando?
se não: pensa em retomar os
para sua vida após o ensino médio:
para sua escolha de profissão futura:
na sua vida estudantil durante o ensino médio:
na construção do seu projeto de vida:
superior: | ||
2.Como está a relação com o mercado de trabalho? | 2.O que foi mais significativo na participação do Programa Cibercidadania? | 2.Quais atividades foram mais significativas na participação do Programa Cibercidadania? universitários: |
3.Outros comentários gerais que queira fazer: | 3.Outros comentários gerais que queira fazer: | 3.Outros comentários gerais que queira fazer: |
para sua decisão em frequentar ou não um curso
na escolha profissional:
como está se mantendo financeiramente, tem apoio familiar?
qual perspectiva de profissão futura?
em relação às possibilidades de acesso e permanência às universidades:
em relação ao contato físico (visitas) com a universidade e troca de experiências com estudantes universitários:
em relação às dinâmicas de roda:
em relação às visitas ao campus da UFSC:
em relação aos diálogos com os estudantes
O Quadro 2 mostra as temáticas e os conteúdos dos três momentos da roda por meio de questionário semiestruturado, dinamizados pelo Círculo Epistemológico. “O conhecimento construído nos Círculos Epistemológicos é manifestação de um processo de conscientização capaz de transformar as concepções que os sujeitos têm da realidade e, consequentemente, a sua atuação sobre ela (Accorssi; Clasen; Veiga Júnior, 2021, p. 7).
O Círculo é dinamizado a partir das contribuições de Paulo Freire onde o diálogo é a base metodológica a ser considerada em todos os momentos. Diálogo que Ramalho (2022), evidencia como Círculo Dialogal em superação ao complexo do oprimido.
A intenção é elaborar o universo temático compartilhado pelo grupo, o qual se captura pela apreensão do pensamento- linguagem que os participantes utilizam para expressar suas experiências e sem a qual a ação pedagógica está comprometida, na perspectiva freiriana. Por conseguinte, o objeto da investigação dos temas-geradores não são os próprios
estudantes, mas sim o pensamento-linguagem que os participantes do grupo usam para se referir à sua realidade, às suas experiências de vida no mundo (Ramalho, 2022, p. 19).
Para evidenciar o círculo dialogal como superação do complexo de inferioridade, insegurança e baixa estima fortalecida em metodologia bancárias, Ramon Rodrigues Ramalho (2022), apresenta cinco dimensões do círculo dialogal, presentes por meio de uma pedagogia dialogal coletiva, que foi considerada na análise das informações coletadas nas entrevistas. São elas: conteúdo, temática, situação limite, percebido-destacado e inédito viável. Todas foram relacionadas na dinâmica do Círculo Epistemológico na seguinte perspectiva, demonstrada no Quadro 3 a seguir.
Dimensões Círculo Dialogal | Perspectivas consideradas no círculo epistemológico |
Conteúdo | A experiência vivenciada com o Programa Cibercidadania |
Temática | A vida profissional |
Situação Limite | Profissões escolhidas antes e depois de participar do Programa |
Percebido- destacado | verbalizações, olhares, e sentimentos sobre a experiência com o Programa; influências para as tomadas de decisões nas escolhas de realização ou não de curso superior |
Inédito Viável | Situação atual a nível profissional |
Sobre a utilização do Círculo Epistemológico podemos concluir que desafiou e convidou os pesquisadores a saírem do papel único de detentor do conhecimento; reposicionou o papel e a presença dos mediadores de modo horizontalizado, estabelecendo um diálogo sobre o objeto de pesquisa. Ou seja, ser pesquisador(a) e pesquisado numa verdadeira troca de saberes, comprometidos com as possibilidades de novos saberes na construção de novos conhecimentos.
Os dados coletados no Círculo Epistemológico foram fundamentais para a identificação da relevância social e produção de conhecimentos por meio do Programa Cibercidadania. Evidenciaram características que servem como pontos para considerar a partir das mudanças conceituais, atitudinais e comportamentais dos estudantes, antes e depois de vivenciarem a experiência com o Programa. O Quadro 4 apresenta essas informações, nas quais foram relacionadas com a cultura de estudos antes e depois do Programa Cibercidadania.
Atitudes antes do Programa | Atitudes após vivência com o Programa |
Ensino médio para ter um emprego melhor | Ensino médio para cursar uma universidade ou curso técnico |
Faculdade como uma possibilidade muito distante | Maior interesse em cursar uma faculdade |
Curso de vigilante e técnico de enfermagem | Cursos envolvendo várias áreas de atuação |
Proficiência acadêmica muito baixa | Ampliação da proficiência acadêmica garantindo aprovações em vestibulares |
Não estudavam apenas copiavam | Criam grupo de estudo e realizam as atividades |
Medo de participar das provas de ampla concorrência | Mais de 70% dos concluintes realizam inscrições em vestibulares |
Famílias indicam finalizar ensino médio para trabalhar | Famílias indicam finalizar ensino médio para fazer uma faculdade |
Esses dados apresentam as tomadas de decisões, representadas por ações atitudinais, que antes do Programa, eram limitadas pelos estudantes da Escola: de estudar para concluir o ensino médio para estudar para fazer um curso superior - de percepção distante para
acessar uma faculdade, para ver como possível e buscar concretizar, etc...
No Círculo Epistemológico os entrevistados participam em clima de roda de conversa, porém com informações fundamentais para as análises necessárias, onde eles mesmos expõem suas opiniões analíticas e com isso ampliam seus pensamentos e a própria consciência sobre sua realidade. “A problematização da realidade torna-se um componente metodológico central da proposta, por meio do incentivo ao diálogo no grupo e no percurso do convívio com a pluralidade e com as diferenças. (Accorssi; Clasen; Veiga Júnior, 2021, p. 9).
Tendo em vista que a metodologia utilizada para desenvolver o Programa foi participativa, mesmo com diferentes ferramentas utilizadas para desenvolver os saberes científicos, inclusive para escolha dos conhecimentos a serem abordados, o diálogo coletivo foi a base para dinamizar os encontros; o momento da entrevista foi de curiosidade, escuta e partilha de suas ações, opiniões e trajetória.
Desse modo, há um incentivo na aprendizagem dialógica já na atitude do encontro, pois as posições e as expressões dos/as “pesquisandos/as” são consideradas valiosas como hipóteses que serão comparadas ao movimento de leitura, teorização e avaliadas pelo grupo. (Accorssi; Clasen; Veiga Júnior, 2021, p.9).
No Círculo Epistemológico foi possível a escuta sensível para o registro dos dados levantados, considerando a criticidade nos posicionamentos explanados pelos entrevistados, indo além da proposta inicial de respostas almejadas. O Quadro 5 apresenta pontos que não haviam sido considerados na observação da relevância social do Programa: essas considerações são frutos das possibilidades democráticas que permearam a dinâmica do Círculo Epistemológico.
Temática | Conteúdo |
Ética profissional | Houve diálogos sobre as novas profissões e as tecnologias e sua utilização ética |
Cultura de Estudos nos corredores da escola | Dialogam nos corredores sobre as atividades, os trabalhos e as avaliações internas e externas a escola. |
Variedade profissionais. | Já se fala em Ciências da Computação, Direito, Arquivologia, Medicina, Ciências da Informação, Letras e Engenharias, Educação Física, Marketing, entre outros. |
Famílias ampliam o olhar sobre o ensino médio | De somar na renda familiar para ter uma profissão por meio da universidade. O sonho passa a ser: ver o filho cursando o nível superior. |
Ao levantar algumas características que não haviam sido consideradas previamente como objeto de pesquisa, apresentados no Quadro 5, evidencia-se o processo de conscientização alterando as concepções dos sujeitos, referente a sua realidade na relação com a sociedade, inclusive as suas atitudes em seu cotidiano que consequentemente impactam na própria organização social.
Podemos dizer que o fazer investigativo, ou o ato de indagação sobre a realidade, que conduz o processo dialógico formativo presente nos Círculos Epistemológicos, refere-se à construção de uma práxis social, a qual exige uma interpretação consciente da sociedade. (Accorssi; Clasen; Veiga Júnior, 2021, p.7).
Diante das ênfases apresentadas pelos estudantes no momento da entrevista, foi possível perceber o diferencial dessa experiência com a metodologia participativa, contribuindo na identificação da relevância social do Programa Cibercidadania para a comunidade universitária e escolar. O Quadro 6 apresenta essas características.
Característica Enfatizadas pelos Entrevistados |
1. Escuta e abertura a mudanças |
2. Metodologia participativa |
3. Proficiência acadêmica dos estudantes da escola |
4. Contato físico na comunidade e na universidade |
5. Acesso a cursos universitários |
6. Formação curricular dos graduandos |
7. Fomentador de sonhos que diminuem a desigualdade social |
As sete características apresentadas na Quadro 6 ganham destaque na fala dos entrevistados, confirmando a transformação cultural, formativa e de consciência, que aconteceu durante o processo pedagógico vivenciado, confirmando a importância dos Círculos Epistemológicos nas metodologias de pesquisas em comunidades empobrecidas, por meio da extensão universitária.
Os Círculos Epistemológicos são, portanto, um desenho de pesquisa que conduz à promoção de processos emancipatórios dos sujeitos que deles participam. É por meio do diálogo que esse processo ocorre, e, assim, todos/as que participam dos Círculos são sujeitos “em conscientização”, que juntos buscam construir uma pronunciação do mundo em comum. (Accorssi; Clasen; Veiga Júnior, 2021, p.8).
Ao analisar as características percebeu-se que a escuta e abertura às mudanças e a metodologia participativa diante dos processos inclusivos onde todos tiveram voz, vez na construção de cada encaminhamento e execução das ações, produziram reflexões, aprendizagens e ensinamentos para todos os envolvidos. Referente ao contato físico na comunidade e na universidade e o acesso a cursos universitários, percebeu-se que a extensão possibilitou uma experiência para além da formação técnica, uma formação social que provoca a empatia profissional e humaniza as relações técnicas necessárias para a
execução das futuras funções. A quantidade de acessos às universidades foi notória após a ampliação da proficiência acadêmica e criação da cultura de estudos, pelos estudantes do ensino médio. E ainda, a relação entre as culturas fomentou a criação de sonhos a partir da construção dos projetos de vida, como uma possibilidade real de concretização.
A informação é produzida, organizada, acessada e apropriada no processo de encontro com o outro. O outro que produz, o outro que organiza, disponibiliza, facilita o acesso e uso, mas que também constrói e oferta dispositivos facilitadores do encontro e do debate com os outros sujeitos, ampliando nossas interpretações. Enfim, nas relações estabelecidas com os outros é que se torna possível a apropriação da informação, entendendo-se aqui apropriação como o processo por meio do qual damos significado à informação, com repercussões no sentido que damos às nossas próprias vidas. (Gomes, 2017 apud Gomes; Novo, 2017, p. 34).
A partir dos resultados obtidos evidenciamos a importância da investigação realizada de maneira participativa, com abordagem crítico interpretativo e coleta de dados a partir da concepção freiriana de atuação. A partir dessa experiência construímos a opinião crítica sobre os relatos dos sujeitos e realizamos um diálogo crítico com a extensão universitária na ciência da informação, reconhecendo que a participação dos estudantes do ensino médio e da graduação, no Programa de extensão Cibercidadania contribuiu nas suas construções de projetos de vida: tanto para o acesso à universidade, quanto para atuação profissional e ou como cidadão, na sociedade.
A ciência da informação e sua abertura à interdisciplinaridade dialogal entre diferentes áreas do conhecimento, cada vez mais, vêm
possibilitando avanços significativos ao tratar da informação. Quando a abordamos a partir dos embates e desafios sociais evidenciamos seu poder de influência nas opiniões, pensamentos e reflexões. “Posto diante do mundo, o homem estabelece uma relação sujeito-objeto da qual nasce o conhecimento, que ele expressa por uma linguagem.” (Freire, 2021, p. 91).
Buscamos analisar e indicar ao longo da pesquisa que originou este relato que o processo participativo é fundamental para a ampliação da consciência crítica da realidade. A garantia de espaços críticos, dialogais, criativos e de alteridade, na relação com a informação, saberes e conhecimentos científicos, possibilitaram o protagonismo dos sujeitos nos processos de construções educativas.
A extensão universitária chegou no território da comunidade Monte Serrat e Alto da Caeira, dialogando com a cultura local sem discriminá-la, trocando conhecimentos e saberes, de maneira democrática, participativa, emancipadora e respeitadora, considerando que “ao se pensar a mediação da informação e o desenvolvimento do protagonismo social no Século XXI, torna-se imprescindível a análise de questões fundantes que repercutem sobre a própria existência humana.” (Gomes, 2017 apud Gomes; Novo, 2017, p. 32).
Os pesquisados são participantes ativos no estudo e os pesquisadores deixam de acreditar que somente eles são os detentores do conhecimento, se colocando em igualdade com os pesquisados. Em movimento, realizam um diálogo comprometido, com interpretações, perguntas e respostas que buscam entender. A investigação é compartilhada e por isso não é possível enquadrar essa prática como se fosse apenas uma ferramenta é necessária uma contraposição às
metodologias que afastam o objeto dos sujeitos e o pesquisador dos pesquisados.
O fazer científico tem o diálogo na sua essência e perpassa por novas perguntas as respostas encontradas, mobilizando a conscientização para a ação cultural. Em um contexto real e com uma prática democrática construída de maneira coletiva com viés emancipatório, a experiência com o Círculo Epistemológico abriu uma nova perspectiva para os pesquisadores permitindo vislumbrar outras experiências virtuosas como esta.
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