Habilidades dos mediadores para a alfabetização científica na biblioteca escolar: aproximações com os saberes freireanos


Mediating skills for scientific literacy in the school library:

approaches to Freirean knowledge


Habilidades de mediadores para la alfabetización científica en la biblioteca escolar: aproximaciones ai conocimiento freireanos


Adriana Rosecler Alcará

Universidade Estadual de Londrina, Brasil

alcara@uel.br ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4639-0967


Sueli Bortolin

Universidade Estadual de Londrina, Brasil

bortolin@uel.br ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7411-2716


Submetido em: 28/02/2023 Aceito em: 05/12/2023 Publicado em: 11/12/2023


Licença:

image

cp


Como citar este artigo:

ALCARÁ, Adriana Rosecler; BORTOLIN, Sueli. Habilidades dos mediadores para a alfabetização científica na biblioteca escolar: aproximações com os saberes freireanos. REBECIN, São Paulo, v. 10, dossiê temático, p. 01-28, 2023. DOI: 10.24208/rebecin.v10.360


RESUMO


O artigo aborda a alfabetização científica na biblioteca escolar. Parte do princípio de que a biblioteca escolar é um "terreno fértil" para o estímulo à curiosidade científica e atribui aos diversos mediadores, em especial, professores e bibliotecários a responsabilidade em estabelecer parcerias e promover habilidades e saberes que contribuam na construção do conhecimento infantojuvenil. Nesse sentido, o objetivo do artigo foi apresentar habilidades e saberes dos mediadores na biblioteca escolar, visando a autonomia dos estudantes e sua apropriação da informação científica. Quanto aos procedimentos metodológicos, utiliza a revisão bibliográfica narrativa, com base no delineamento bibliográfico e documental não exaustivo, com abordagem qualitativa. Dentre os resultados, evidencia-se um conjunto de saberes (conhecimentos, procedimentos, atitudes e valores), que precisam integrar as ações do mediador na alfabetização científica dos estudantes. Conclui que é urgente a necessidade da realização de pesquisas mais aprofundadas quanto às habilidades do mediador, mas também das crianças e jovens. No mesmo sentido, é fundamental promover ações colaborativas entre o professor e o bibliotecário de maneira a incentivar nos estudantes o espírito investigativo.


Palavras-Chave: apropriação da informação científica; habilidades do mediador; biblioteca escolar; alfabetização científica.


ABSTRACT


The article addresses scientific literacy in the school library. lt assumes that the school library is a "fertile ground" for stimulating scientific curiosity and assigns the responsibility for establishing partnerships and promoting skills and knowledge that contribute to the construction of children's knowledge to the various mediators, especially teachers and librarians. ln this sense, the objective of the article was to present skills and knowledge of mediators in the school library, aiming at students' autonomy and their appropriation of scientific information. As for methodological procedures, it uses a narrative bibliographic review, based on a non-exhaustive bibliographic and documentary design, with a qualitative approach. Among the results, a set of knowledge is evident (knowledge, procedures, attitudes and values), which need to integrate the mediator's actions in the scientific literacy of students. lt concludes that there is an urgent need to


carry out more in-depth research into the skills of the mediator, but also of children and young people. ln the sarne sense, it is essential to promote collaborative actions between the teacher and the librarian in arder to encourage the investigative spirit in students.


Keywords: appropriation of scientific information; mediator skills; school library; scientific literacy.


RESUMEN


EI artículo aborda la alfabetización científica en la biblioteca escolar. Asume que la biblioteca escolar es un "terreno fértil" para estimular la curiosidad científica y asigna a los distintos mediadores, especialmente profesores y bibliotecarios, la responsabilidad de establecer alianzas y promover habilidades y conocimientos que contribuyan a la construcción dei conocimiento de los ninas. En este sentido, el objetivo dei artículo fue presentar las habilidades y conocimientos de los mediadores en la biblioteca escolar, visando la autonomía de los estudiantes y su apropiación de la información científica. En cuanto a procedimientos metodológicos, utiliza una revisión bibliográfica narrativa, basada en un diseno bibliográfico y documental no exhaustivo, con un enfoque cualitativo. Entre los resultados, se evidencia un conjunto de conocimientos (conocimientos, procedimientos, actitudes y valores), que necesitan integrar las acciones dei mediador en la alfabetización científica de los estudiantes. Se concluye que es urgente realizar una investigación más profunda sobre las habilidades dei mediador, pero también de los ninas y jóvenes. En el mismo sentido, es fundamental promover acciones colaborativas entre el docente y el bibliotecario con el fin de fomentar el espíritu investigativo en los estudiantes.


Palabras clave: apropiación de la información científica; habilidades de mediador; biblioteca de la escuela; alfabetización científica.


  1. INTRODUÇÃO


    O discurso quanto à necessidade de pesquisas interdisciplinares defendido na atualidade é positivo, no entanto, para a Ciência da Informação e Biblioteconomia, transitar por outras vias não é uma tarefa


    simples, mesmo quando a "estrada" é uma área tão próxima como a Educação. Portanto, é necessário das duas áreas um movimento maior de aproximação teórico-científica, exemplo disso, são as pesquisas ligadas ao tema: educação científica, alfabetização científica, mediação científica, letramento científico ou outra denominação veiculada em diferentes publicações acadêmicas em nosso país. Uma produção colaborativa nesse sentido traria uma contribuição significativa para as áreas mencionadas. Em especial, se ela ocorresse abrangendo diversas disciplinas.

    Acredita-se que é necessário pensar na importância de ações para a iniciação científica para as crianças e jovens na escola é fundamental, pois elas precisam desde cedo ter acesso à informação científica, saber qual seu objetivo, como ela se processa e quais são os seus reflexos no ambiente social; para que ao chegar na universidade seu aprimoramento intelectual e social possa fluir com maior desenvoltura e menos sacrifícios. Além disso, para que analise o mundo natural e social em sua complexidade.

    Diante disso, a questão que norteou este estudo consistiu em refletir sobre aproximações de alguns saberes freireanos com as habilidades dos mediadores para a alfabetização científica na biblioteca escolar. Dessa forma, o objetivo do artigo foi apresentar habilidades e saberes dos mediadores na biblioteca escolar, visando a autonomia dos estudantes e sua apropriação da informação científica.

    Para tanto, desenvolveu-se uma revisão bibliográfica narrativa, com base no delineamento bibliográfico e documental não exaustivo, com abordagem qualitativa. Vale enfatizar que a revisão bibliográfica narrativa não segue critérios sistemáticos e exaustivos para a busca e seleção do


    material a ser analisado, não obrigando os autores a esgotarem as fontes de informação. Nesse caso, a seleção das fontes de informação, assim como a interpretação das informações, de forma geral, estão alinhadas à subjetividade dos autores do estudo (Mendes-da-Silva, 2019).

    Assim, além das fontes bibliográficas, utilizaram-se também documentos governamentais (leis e diretrizes). Para o levantamento das produções foram efetuadas buscas na web (google acadêmico e sites governamentais), tendo sido selecionados alguns textos em língua portuguesa, sem recorte temporal e veiculados em publicações da área de Biblioteconomia e de Educação, de autores que tratam da informação científica para o público infantojuvenil, biblioteca escolar, habilidades informacionais e apropriação da informação.


  2. ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA E A BIBLIOTECA ESCOLAR


    Antes de abordar a expressão - alfabetização científica - apresenta-se aqui algumas considerações ligadas à biblioteca escolar, temática considerada imprescindível à formação de habilidades para a busca e apropriação da informação científica.

    No âmbito dos órgãos de classe da Biblioteconomia deve-se mencionar que na cidade de São Paulo, em 1990, ocorreu a discussão a respeito da importância da consolidação da biblioteca escolar como instituição basilar aos demais gêneros de biblioteca. Nessa ocasião, o Conselho Regional de Biblioteconomia de São Paulo (CRB-8) "[...] encaminhou ao CFB [Conselho Federal de Biblioteconomia] os projetos desenvolvidos. Tal articulação levou o CFB a lançar o Projeto Mobilizador: biblioteca escolar, construção de uma rede de informação para o ensino


    público [...]." (Viana, 2014, p. 41). Esse Projeto desencadeou e vem desencadeando outras iniciativas de importante relevância, entre elas a Lei 12.244 que entrou em vigor no dia 24 de maio de 201O e dispõe sobre a universalização das bibliotecas nas instituições de ensino do Brasil. Apresenta-se no quadro 1 e nos parágrafos posteriores os trâmites para a elaboração da referida Lei e qual a sua situação atual.


    Quadro 1 - Lei 12.244/201O

    Iniciativas

    Resultados


    2000 - Deputada federal Esther Grossi apresenta Projeto de Lei 3.549, dispondo sobre a universalização de bibliotecas escolares.


    Encerrou a legislatura da deputada antes do Projeto ser enviado à Presidência da República.

    2003 - Deputado federal Lobbe Neto apresenta Projeto de Lei Ordinária no. 1.831

    (representação do PL de Esther Grossi).


    Essa proposta tramitou por sete anos e foi aprovada em abril 2010.

    2010 - Senador Cristovam Buarque fez parecer favorável ao PL do deputado Lobbe Neto.


    Foi sancionada e publicada a Lei Federal 12.244 de 24 de maio de 201O, pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

    Fonte: Viana (2014, p. 40)


    No entanto, essas iniciativas não foram suficientes para "sensibilizar" os governos (em todas as instâncias) em manter ou implantar bibliotecas nas escolas. Pelo contrário, a cultura de descontinuidade governamental no Brasil faz o projeto de criação e manutenção de bibliotecas nas escolas fenecer.


    É necessário destacar ainda que, em 2018, algumas alterações na Lei 12.244/201O foram indicadas, entre elas o Projeto de Lei 9.484/20181 proposto pelas então deputadas federais Laura Carneiro e Carmen Zanotto, em 06 de fevereiro de 2018. Com esse Projeto, pretende-se ampliar o conceito de biblioteca escolar que "[...] não pode ser confundida com um simples acervo ou depósito estático de livros e materiais.". Para tanto, apresenta a seguinte justificativa:

    não podemos privar as atuais e futuras gerações que hoje frequentam os bancos escolares do acesso à informação e à leitura. Face às condições de desigualdade e pobreza da grande maioria da população brasileira, a biblioteca escolar constitui um dos poucos e únicos espaços onde nossas crianças, adolescentes e jovens podem aprender e ter condições de competir, em condições de igualdade, para inserir-se num mundo cada vez mais globalizado, permeado de novos suportes de informação e tecnologia. (BRASIL, 2018).


    Outro aspecto importante do referido Projeto de Lei é a criação do Sistema Nacional de Bibliotecas Escolares (SNBE) que, ao ser implantado, trará benefícios às bibliotecas escolares, visto que permite o enriquecimento constante entre as bibliotecas e os profissionais da educação (professores, pedagogos, bibliotecários, entre outros). Este Sistema

    [...] terá, entre suas principais funções, dar condições efetivas para que os sistemas de ensino dos estados e municípios possam implantar esse equipamento cultural em todas as escolas do país. O SNBE possibilitará, também, uma maior integração na medida que envidará esforços para conectar todas as bibliotecas escolares do país na rede mundial de computadores, de forma a facilitar o empréstimo de livros e publicações virtuais e troca de experiências entre as mesmas [...]. (BRASIL, 2018)


    image

    1 Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2167716. Acesso em: 20 jan. 2023.


    Essa proposta transforma a biblioteca escolar de um mero coletivo de livros para ser de fato um laboratório em que estudantes e educadores possam desenvolver a alfabetização científica e apropriar-se da informação.

    Em 2020, fomos surpreendidos com a pandemia da COVID-19. No Brasil, a área de saúde quase entra em colapso, as escolas e as bibliotecas foram fechadas. Houve uma crise sanitária instalada que só piorou as incertezas e confrontos políticos existentes. Nesse cenário também em 2020 a deputada federal Dayane Pimentel, por meio da PL 4401/202 solicita o adiamento do prazo da Lei 12.244 de 2020 para 20223. Sua justificativa foi que a referida pandemia atrapalhou qualquer tipo de negociação nesse assunto.

    Outra mudança sugerida na proposta determina que o acervo mínimo de cada biblioteca escolar seja de 2.500 títulos, além do parâmetro atual de um livro por aluno matriculado. A deputada avalia que a exigência de 2.500 títulos vai garantir que mesmo as bibliotecas de pequenas escolas ofereçam opções suficientes para o desenvolvimento dos alunos. (Siqueira, 2020, não paginado).


    O ínfimo acréscimo no prazo de validade da Lei e o estabelecimento de quantidade de títulos para o acervo da biblioteca escolar, não representaram avanço, não viabilizaram e nem pressionaram a tomada de iniciativas de melhoria para as bibliotecas escolares. A expectativa da área, a modelo do que Almeida Júnior (2021) propõe para bibliotecas públicas, é de que uma biblioteca escolar não deve ser nem


    image

    2Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2261203

    3Mais recentemente, de acordo com a Agência Senado, em matéria de 14/09/2023, "Inicialmente, o texto determinava que o plano de universalização deveria ser concluído no prazo de vigência do Plano Nacional de Educação (PNE), ou seja, até 2024. Como o prazo já está próximo do fim, a relatora propôs a extensão até 2028".

    Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2023/09/14/senado-aprova-criacao-do­ sistema-nacional-de-bibliotecas-escolares. Acesso em: 20 nov. 2023.


    ingênua, nem astuta e sim crítica4 utilizando em suas mediações"[...] não só a leitura do texto escrito, mas também a leitura da imagem fixa, da imagem em movimento e do som." (Almeida Júnior, 2021, p.64)

    As diferentes leituras e ações mediadoras fomentarão a formação de habilidades, possibilitando aos estudantes o contato com linguagens variadas, incluindo-se a científica. Em se tratando da alfabetização científica, Chassot (2003, p.93) destaca que ela se refere ao conhecimento dos fazeres cotidianos da ciência e da linguagem científica; "[...] é saber ler a linguagem em que está escrita a natureza." O autor ainda enfatiza que a alfabetização científica ocorrerá


    [...] quando o ensino da ciência, em qualquer vel [...] contribuir para a compreensão de conhecimentos, procedimentos e valores que permitam aos estudantes tomar decisões e perceber tanto as muitas utilidades da ciência e suas aplicações na melhora da qualidade de vida, quanto as limitações e consequências negativas de seu desenvolvimento (Chassot, 2003, p.99).


    Essa compreensão dos conhecimentos, procedimentos e valores quanto à utilidade da ciência se dará a partir de projetos e pesquisas de iniciação científica na escola, cuja base para a sua construção é a busca e o uso da informação. Nesse sentido, a biblioteca escolar precisa subsidiar os estudantes e professores na realização desses projetos e pesquisas, por meio de ações que oportunizem o desenvolvimento de habilidades e, consequentemente, da alfabetização científica.

    Medeiros (2016) alerta que, para promover a alfabetização científica, são necessárias atividades que propiciem o desenvolvimento de habilidades próprias do fazer científico. Ela acrescenta que "A


    image

    4 Tendo como base os tipos de consciência do ser humano propostos por Paulo Freire, Almeida Júnior (2021) classifica a biblioteca pública em: innua, astuta e crítica.


    alfabetização científica é um processo que capacita os estudantes a se posicionarem de modo crítico às questões científicas presentes no cotidiano [...]" (Medeiros, 2016, p. 6), compreendendo o papel da ciência na sociedade e os aspectos envolvidos na construção do conhecimento científico.

    As ações promovidas pela biblioteca em parceria com a escola devem propiciar ao estudante a busca e o uso da informação, assim como a reflexão sobre a ciência, seus impactos e procedimentos necessários ao fazer científico. E isso pode se constituir em um ambiente favorável à apropriação da informação.

    Reportando-se à apropriação da informação é relevante mencionar o conceito estabelecido embrionariamente por Santos Neto, Bortolin e Almeida Júnior (2017, p.14), isto é:

    [...] todo ato cotidiano realizado pelo leitor[...] com intenção de

    apoderar-se e atribuir significados aos conteúdos nos mais variados ambientes e suportes, com o intuito de suprir necessidades simples ou complexas, de cunho profissional, educacional, psicológica e cultural, podendo repercutir em uma alteração no arcabouço cognitivo do cidadão, bem como na produção de sentidos.


    Partindo do pressuposto de que toda apropriação só ocorre no momento da interpretação/produção de sentidos, todos os gêneros textuais permitem uma pluralidade de apropriações; mas tanto a interpretação quanto a apropriação, não devem ser impostas e sim dialogadas.

    Refere-se aqui primeiramente aos textos literários. Para desmistificar preconceitos, destaca-se que no gênero literário ou artístico evidencia-se prioritariamente a subjetividade que exige liberdade para o


    leitor imaginar o que existe além das linhas, o que também pode levar o leitor a se apropriar de informações científicas.

    Nesse sentido, Borges (2016, p.17) alerta que é necessário: "[...] reconhecer a literatura como uma possibilidade criativa de reflexão sobre questões sociais". Um exemplo que pode ser citado é o livro A Chave do tamanho, do escritor brasileiro Monteiro Lobato. Para Nilson, Boer e Fuzer (2016) é possível abordar a sustentabilidade ambiental com as crianças, pois a Emília após ser reduzida de tamanho, e, para não morrer devorada pelos bichos, observa a natureza, os animais e até os buracos em que eles se escondem. Nesses "[...] aspectos da natureza Emília analisa e busca aprender para poder interagir com o meio sem que sua subsistência seja comprometida." (Nilson; Boer; Fuzer, 2016, p. 2014).

    No texto científico, em especial na escola, o mediador deve utilizar estratégias pedagógicas que levem a criança a compreender e se apropriar do que lê; isso pode ocorrer por meio de constantes perguntas. Em outras palavras, o questionamento é elemento fundamental na prática investigativa. Portanto, o acesso aos textos científicos e o ato de pesquisa devem iniciar na inncia, pois segundo o Ministério da Educação e Desporto: as crianças "[...] Desde muito pequenas aprendem sobre o mundo, fazendo perguntas e procurando respostas às suas indagações e questões." (Brasil, 1998, p. 163).

    O incentivo à pesquisa, por parte das crianças, também é indicado no documento Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil (DCN). Visando verificar as propostas para o ensino científico, encontrou­ se a seguinte recomendação: "Incentivem a curiosidade, a exploração, o encantamento, o questionamento, a indagação e o conhecimento das


    crianças em relação ao mundo físico e social, ao tempo e a natureza[...]." (Brasil, 201O, p. 26).

    Considerou-se necessário, também, consultar outros dois documentos oficiais brasileiros para encontrar subsídios para essa temática, sendo eles: Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) e Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI). No entanto, não há uma referência explícita à alfabetização científica, assim buscou-se uma explicação na literatura da área de Educação para essa ausência. Nela encontrou-se o trabalho de Menezes e Lira-da-Silva (2013, p. 1927-1928) apresentado no IX Congreso Internacional sobre lnvestigación en Didáctica de Las Ciencias com a seguinte análise: "No campo da EC [Educação Científica] e ensino de ciências, consideramos que as DCNEI representam um retrocesso em relação ao RCNEI (1988), que sugeria como experiência de Conhecimento de Mundo, o eixo Natureza e Sociedade." Para as autoras, as DCNEI enfocam questões ligadas aos recursos naturais e o RCNEI reconhece que a criança precisa "[...] observar fenômenos, relatar acontecimentos, formular hipóteses, prever resultados para experimentos, conhecer diferentes contextos [...]."

    A atitude de incentivo da inquietação nos estudantes por meio da pesquisa também é enfatizada nas Diretrizes Curriculares para a Educação Básica (DCN), quando se reportam à pesquisa como princípio pedagógico (Brasil, 2013). De acordo com esse documento, a promoção da inquietação nos estudantes contribui para que possam formular questões para investigação e buscar respostas de maneira autônoma.

    A pesquisa pode instigar a curiosidade do estudante "[...] em direção ao mundo que o cerca,[...] na busca de informações e de saberes,


    que sejam do senso comum, escolares ou científicos." (Brasil, 2013, p.

    164).

    Outro aspecto abordado nas DCN se refere ao aprendizado contínuo ao longo da vida, necessário para a sobrevivência no ambiente informacional atual. "Esse novo modo de ser requer que o aluno, para além de adquirir determinadas informações e desenvolver habilidades para realizar certas tarefas, deve aprender a aprender, para continuar aprendendo." (Brasil, 2013, p. 163).

    Esse contexto exige dos estudantes o desenvolvimento contínuo de habilidades informacionais que podem ser promovidas pela biblioteca escolar, por meio do apoio à pesquisa científica na escola, construção de projetos e demais ações que envolvam a busca, o uso e a apropriação da informação.

    A biblioteca escolar, de acordo com as Diretrizes da lnternational Federation of Libraries Associations (IFLA) (2006, p. 3), "[...] desenvolve nos estudantes competências para a aprendizagem ao longo da vida e desenvolve a imaginação, permitindo-lhes tornarem-se cidadãos responsáveis." Nesse sentido, fica evidente a incumbência da biblioteca escolar na apropriação científica dos estudantes que estão sob a sua responsabilidade.

    Pensar a informação científica como uma ação restrita dos adultos, além de desconsiderar o período de importante desenvolvimento da aprendizagem que é a infância e a juventude, pode levar o cidadão a acreditar que o fazer científico seja algo inatingível, destinado aos "escolhidos".

    Em julho de 2003, no Brasil, o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTI) criou o Departamento de Popularização e Difusão de Ciência e


    Tecnologia visando "[...] à apropriação pelo público em geral e pelas instituições de ensino, de conhecimento científico e tecnológico." (Menkes, 2012, grifo nosso). Entre diversas iniciativas, esse Departamento realizou no território brasileiro a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, que teve como principal objetivo "[...] mobilizar a população, em especial crianças e jovens, com atividades de C&T" (Menkes, 2012).

    No período de 2004 a 2023 realizaram-se diversas edições da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, em que várias temáticas foram debatidas e vivenciadas em espaços como: museu, escola, biblioteca, jardim botânico, zoológico, institutos de pesquisa. Em cada ano houve um tema proposto, sendo eles: Olhar para o céu (2004), Brasil olhe para a água (2005), Criatividade e Inovação (2006), Terra (2007), Evolução & Diversidade (2008), Ciência no Brasil (2009), Ciência para o Desenvolvimento Sustentável (201O), Mudanças climáticas, desastres naturais e prevenção de riscos (2011), Economia Verde, Sustentabilidade e Erradicação da Pobreza (2012), Ciência, Saúde e Esporte (2013), Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento Social (2014), Luz, Ciência e Vida (2015), Ciência Alimentando o Brasil (2016), A Matemática está em Tudo! (2017), Ciência para a Redução das Desigualdades (2018), Bioeconomia: Diversidade e Riqueza para o Desenvolvimento Sustentável (2019), Inteligência Artificial: a Nova Fronteira da Ciência Brasileira (2020), A transversalidade da Ciência, Tecnologia, Educação para o Planeta (2021), o Bicentenário da Independência: 200 anos de ciência, tecnologia e inovação no Brasil (2022) e Ciências Básicas para a Sustentabilidade (2023).


    No entanto, outros movimentos de pensar a ciência ainda são necessários para que o sujeito se torne um constante aprendiz. Evidentemente que a escola e sua biblioteca são e serão os espaços prioritários educativos (mesmo sem receberem o valor merecido), portanto, elas devem estar abertas para práticas dialogadas. "Rigorosamente falando, o aprender, ou a convicção de que podemos ter algo como um saber ou um conhecimento, já aparece como resultado de uma interação (comunicativa) com os outros." (Boufleuer, 2017, p. 76)

    Além do espaço escolar, destacam-se, entre outras iniciativas, três projetos que no Brasil tem uma contribuição fundamental na popularização da ciência destinada ao pesquisador infantojuvenil, são eles: Ciência Hoje das Crianças5, Ciência Divertida6 e Minas faz Ciência lnfantil7. A ênfase a eles deve-se ao fato de que se este público acessar a ciência de forma recreativa, colorida e interativa a possibilidade de gostar da investigação científica se amplia.

    Ressalta-se, ainda, que apropriar-se da informação exige primeiramente habilidades no uso de bibliotecas e demais equipamentos informacionais. De maneira geral, no ambiente familiar não existe biblioteca e no contexto escolar, apesar da referida Lei mencionada, a biblioteca nem sempre é realidade ou, quando existe, sofre de uma constante invisibilidade por parte dos professores e estudantes.

    Para o desenvolvimento de pesquisas em uma nação, a biblioteca precisa ser base e ensinar o estudante a buscar, usar e se apropriar da informação. Nesse caso, é necessário o constante estímulo à curiosidade, o exercício do senso crítico, a orientação sistemática para a observação,



    image

    5 Disponível em: http://chc.orq.br/ Acesso em: 20 nov. 2023.

    6 Disponível em: cienciadivertida.com.br Acesso em: 20 nov. 2023.

    7 Dispovel em: http://minasfazciencia.com.br/infantil/revista/ Acesso em: 20 nov. 2023.


    o registro e a análise de informações para os diferentes níveis de ensino, não apenas para o Ensino Médio e Ensino Superior, incluindo-se também gradativa e cotidianamente o ensino de conteúdos e posturas científicas desde a Educação Infantil.

    Vale destacar que, no caso do estudante infantojuvenil a apropriação precisa ser pensada nas dimensões propostas por Vygotsky, isto é, o sujeito mais experiente influencia o sujeito menos experiente para assim se apropriar do conhecimento. Segundo Rego (2013, p.111)


    Geralmente associa-se a atividade imitativa a um processo puramente mecânico, de cópia e repetição. Entretanto [...] para Vygotsky, a imitação oferece oportunidade de reconstrução (interna) daquilo que o indivíduo observa externamente. A imitação pode ser entendida como um dos possíveis caminhos para o aprendizado, um instrumento de compreensão do sujeito.


    Em sua tese intitulada Apropriação da informação: os elementos,

    o processo e a materialização da informação, Ellen Valotta Elias Borges, tendo como base a teoria da complexidade de Edgar Morin, estabelece sete categorias da apropriação da informação: sistêmica, hologrâmica, retroativa, recursiva, regeneradora, dialógica e interdependente. Pelo interesse específico deste texto, volta-se a atenção apenas à apropriação regeneradora e apropriação dialógica. Para a autora a apropriação regeneradora "[...] é um processo constante, inacabado e sempre estará em desenvolvimento. [...] um processo sem fim; é um processo que não para de se autoproduzir." (Borges, 2018, p.148-149). E na apropriação dialógica "[...] a informação precisa ser construída. Este processo é dialógico e produzido por meio das relações de construção, desconstrução e reconstrução." (Borges, 2018, p.148-149).


    Aqui se estabelece a relação mediador-estudante quando um diálogo é estabelecido e o mediador interfere na aprendizagem do estudante. Por isso, o mediador e o mediado devem valorizar o movimento de busca por informação (qualquer gênero), que é um ato constante em nossas vidas e não cessa assim que finaliza o período escolar. Caso contrário, o conhecimento seria algo estagnado sem possibilidade de renovação. Para a ciência, o aparecimento de informações contraditórias é tão, ou mais importante, que as informações similares.

    Ao pesquisador iniciante precisa ser ensinado que um fato ou um fenômeno só se torna verdade após o processo de busca informação fidedigna, isto é, uma averiguação minuciosa, seguida de reflexão. Aprender também que a verdade é relativa e pode (deve) passar por constantes revisões. Enfim, pesquisar exige esforço, dedicação e habilidade; habilidade não no sentido de aptidão, pois é um ato aprendido e aperfeiçoado. Aperfeiçoado com o significado de aprimorado e não de perfeição, pois a ciência é falível e os cientistas também.


  3. HABILIDADES DO MEDIADOR NA ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA


Para Chaplin (1981, p.261), habilidade é a "[...] faculdade de realizar um acto. A habilidade pode ser inata ou resultante da prática.". Portanto, não deve ser considerada apenas como sinônimo de capacidade ou aptidão. Refletindo a respeito de aptidão, Piéron (1996, p.39) defende que "[...] designa o substrato constitucional de uma capacidade, preexistindo a esta, que dependerá do desenvolvimento natural [...], da formação educativa e do exercício."


Dessa forma, a habilidade não é um pressuposto nato e nem transferível, cabendo aos sujeitos mais experientes (na escola, os profissionais da educação), viabilizar condições para que o estudante saiba "lidar com informações", isto é, utilizar fontes diversificadas com destreza e segurança.

Destaca-se, porém, que habilidade "[...] não necessariamente implica em competência. A habilidade indica facilidade em lidar com um tipo de informação e para que se transforme em competência será necessário investimento em experiências de aprendizagem." (Primi et ai., 2001, p.155).

Afinal, quais são as habilidades necessárias para ensinar pesquisa e realizar pesquisa? O presente estudo não tem a intenção de arrolar predicativos nem do estudante nem do mediador e sim provocar algumas reflexões que possam evidenciar a informação e a apropriação dela para o avanço da ciência.

Ao refletir a respeito da pesquisa no cotidiano da escola e da biblioteca escolar é relevante se referir a Paulo Freire, quando ele defende que: "Estudar é, realmente, um trabalho difícil. Exige de quem o faz uma postura crítica, sistemática. Exige uma disciplina intelectual que não se ganha a não ser praticando-a." (Freire, 1996, p. 9).

Assim, tanto o estudante quanto o mediador, é fundamental que sejam minimamente interessados pela leitura, pela ciência e, em especial ao mediador, que tenha consciência da sua interferência na vida dos estudantes.

Paulo Freire (1996), em sua obra Pedagogia da Autonomia, aborda os saberes necessários ao ensino em geral, porém para este estudo relacionou-se os saberes propostos pelo autor ao fazer científico (quadro


2), podendo os mesmos serem utilizados pelo mediador, tendo em vista as habilidades dos estudantes para a alfabetização científica e, a consequente apropriação da informação. Dito de outra forma, posturas fundamentais dos mediadores na escola para que o estudante amplie seu interesse pela pesquisa e tenha sucesso na realização da mesma.

Justifica-se que a escolha desses saberes não ocorreu apenas pelo fato de Paulo Freire ser patrono da Educação brasileira, mas principalmente pela extensa produção e experiência quanto ao ato de ensinar e estudar. Além disso, Paulo Freire, como afirma Edna Castro de Oliveira, no prefácio da obra Pedagogia da Autonomia, com sua sensibilidade:

[...] problematiza e toca o educador [o que] aponta para a dimensão estética de sua ptica que, por isso mesmo pode ser movida pelo desejo e vivida com alegria, sem abrir mão do sonho, do rigor, da seriedade e da simplicidade inerente ao saber-da-competência. (FREIRE, 1996, p,11-12)


Saberes para prática educativa de Freire

Habilidades do mediador para promover alfabetização científica na biblioteca escolar

Ensinar exige rigorosidade metódica

Promover o fazer científico com planejamento, organização e ética

Ensinar exige pesquisa

Ter persistência na busca de informação em múltiplas fontes

Ensinar exige respeito aos saberes dos educandos

Valorizar o conhecimento e a experiência pessoal;

Ensinar exige criticidade

Colaborar no desenvolvimento do espírito crítico do estudante

Ensinar exige estética e ética

Refletir sobre suas obrigações e

cuidados éticos em relação ao estudante, "sem ares de quem possui a verdade".

Quadro 2 - Saberes freireanos e as habilidades do mediador para alfabetização científica



Promover a sensibilidade orientada para a imaginação e a criatividade

Ensinar exige corporeificação das palavras pelo exemplo

Se o mediador não pesquisa, não pode exigir do estudante que ele faça isso.

Ensinar exige risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação

Relativizar a sua verdade que é mutável e deve ser democrática, respeitando a subjetividade do humano

Ensinar exige reflexão crítica sobre a prática

Relacionar a teoria e a prática de maneira dialética e com responsabilidade social

Ensinar exige reconhecimento e

assunção da identidade cultural

Autoconhecimento por parte do

mediador, assumindo-se como um ser que interfere socialmente

Ensinar exige consciência do inacabamento

A predisposição para a revisão das pesquisas e de seus procedimentos dignifica o seu fazer

Ensinar exige reconhecimento de ser condicionado

A consciência do nosso condicionamento histórico, social e humano (influências, tendências, manipulações) nos faz superar e alterar realidades científicas e, consequentemente, sociais

Ensinar exige respeito à autonomia do ser do educando

Abrir espaço para que o educando seja curioso o fará inquieto e desejoso em aprender ao longo da vida

Ensinar exige bom senso

Disposição para mudanças, respeitando a dignidade e identidade do educando

Ensinar exige humildade, tolerância e luta em defesa dos direitos dos educadores

Compreender o educando, respeitando-o sempre, em especial, em suas apropriações

Ensinar exige apreensão da realidade

Pesquisar sempre de forma contextualizada à realidade para que a pesquisa não se torne desaproveitada

Ensinar exige alegria e esperança

Satisfação com os resultados na expectativa de que eles contribuam com mudanças sociais e científicas


Ensinar exige convicção de que a mudança é possível

Refletir a respeito dos diferentes contextos e realidades e de como as práticas científicas podem mudá-las

Ensinar exige curiosidade

Promover curiosidade científica

Ensinar exige segurança, competência profissional e generosidade

Buscar a formação continuada tendo em vista a competência científica e sensibilizar-se ao ato de compartilhar

Ensinar exige comprometimento

Buscar o comprometimento consigo mesmo, com o estudante e com a sociedade

Ensinar exige compreender que a educação é uma forma de intervenção no mundo

Conscientizar os estudantes de que a pesquisa científica também pode se constituir em uma forma de intervenção

Ensinar exige liberdade e autoridade

Ser criativo e se atentar para a procedência das fontes de informação

Ensinar exige tomada consciente de decisões

Conscientizar para a prática de decisões sempre baseada nos dados da pesquisa

Ensinar exige saber escutar

Escutar os autores e os leitores

Ensinar exige reconhecer que a educação é ideológica

Estar consciente de que mediar na alfabetização científica é também uma forma de interferir no aprender do estudante

Ensinar exige disponibilidade pelo diálogo

Promover trocas entre mediador e estudante

Ensinar exige querer bem aos educandos

Gostar de pesquisar e acima de tudo ser sensível ao estudante e ensiná-lo a pesquisar

Fonte: Elaborado pelas autoras, com base em Freire (1996)


Ao analisar os diferentes saberes listados no quadro 2 pode-se visualizar saberes relacionados aos conhecimentos, aos procedimentos para a busca e o uso de recursos informacionais para fazer a pesquisa, mas, especialmente, destacam-se as atitudes e os valores inerentes ao


processo de ensinar (mediador) e de aprender (estudante). Acredita-se que é o conjunto desses saberes que deve permear as ações dos bibliotecários e demais mediadores, tendo em vista a formação das habilidades do estudante para a alfabetização e apropriação da informação científica.

Ao se pensar na alfabetização cientifica, muito além dos conhecimentos técnicos e científicos, é preciso mobilizar o estudante para perceber o valor da ciência e de suas atitudes frente à ciência e os impactos disso para a sociedade. Nesse sentido, é que a ética, a estética, o bom senso, a curiosidade, a criticidade, a reflexão, a responsabilidade e o comprometimento, que integram as habilidades atitudinais, devem ser promovidas no âmbito da escola e da biblioteca escolar.

Outra questão que se deve evidenciar no processo da alfabetização científica é a linguagem científica presente nos textos e a usada pelos professores. Nesse aspecto, Carelli et ai. (2015, p. 166) alertam: "Ao iniciar a vida escolar, o aluno obtém o conhecimento com linguagem cotidiana, cabe, portanto ao professor, iniciar a cultura científica [...]" com múltiplos questionamentos. Ao analisar a linguagem utilizada na já referida Revista Ciência Hoje das Crianças, essas autoras concluem que ela é "[...] baseada em narrativas, o que facilita o entendimento e a assimilação da informação e do conteúdo científico pelas crianças." (Carelli et ai., 2015, p. 166). Em outras palavras, a forma como a informação é mediada nesse periódico desperta a curiosidade das crianças e as instiga a pesquisar.

Para um ambiente ideal que possa mobilizar pesquisas diversificadas são "[...] necessárias as condições propícias [...], por exemplo, corpo docente qualificado, boa infra-estrutura das escolas e


uma proposta curricular ajustada." (Fialho; Moura, 2005, p. 195). Vale destacar que no senso comum imagina-se que essas condições apontadas no parágrafo anterior ocorrem apenas em instituições privadas e não nas escolas públicas. Essa polaridade deve ser evitada, já que existem algumas escolas públicas fazendo um trabalho enriquecedor e na contramão de escolas particulares sem biblioteca (ou acervo fechado), sem laboratório (ou equipamentos intocáveis) e sem projetos que levem à curiosidade científica.

A falta de promoção da pesquisa e da busca da informação científica pelas crianças é uma situação lamentável, pois Menezes e Lira­ da-Silva (2013, p. 1926) destacam que a Educação Científica"[...] é direito da criança que necessita se apropriar do conhecimento científico construído em uma cultura relativa ao seu modo de compreender o mundo."

Nessa mesma perspectiva, Sasseron e Carvalho (2011, p. 61) evidenciam a necessidade de se valorizar a iniciação científica na escola, por meio da alfabetização científica, que visa"[...] planejar um ensino que permita aos alunos interagir com uma nova cultura, com uma nova forma de ver o mundo e seus acontecimentos." Esse ensino, segundo elas, deve promover uma prática consciente possibilitada por saberes e conhecimentos científicos, assim como habilidades associadas ao fazer científico.


3 CONSIDERAÇÕES FINAIS


Como dito inicialmente, este estudo visou apresentar habilidades e saberes dos mediadores para a alfabetização científica na biblioteca


escolar, fazendo algumas aproximações com saberes freireanos. Foi possível refletir sobre a relevância de se pensar em um conjunto de saberes, agregando conhecimentos, procedimentos, atitudes e valores, que precisam integrar as ações do mediador no processo de formação da alfabetização científica dos estudantes, que requer a busca, o uso e a apropriação da informação.

Ao chegar na biblioteca escolar os estudantes não sabem como usá-la e os profissionais, em geral, não estão preparados ou não percebem a importância em ensinar isso a eles. Os pais, os principais interessados na formação educacional dos filhos, de forma geral, não se preocupam em saber se há na escola esse espaço e se seu acervo está disponível.

Acredita-se que a biblioteca escolar ainda não tem forte presença na vida dos pesquisadores infantojuvenis. Possivelmente porque seus acervos são limitados, qualitativamente e quantitativamente, e não tem disponíveis recursos tecnológicos atualizados para contribuir na construção de pesquisas. O mesmo acontece com a mediação para a alfabetização científica. Mediação que, se realizada criteriosamente, pode levar o estudante a fazer investigações de maneira divertida, mas com seriedade e responsabilidade.

Deve-se evidenciar que para o público infantojuvenil o número de pesquisas que trata das habilidades para a apropriação da informação científica é substancialmente menor que para o pesquisador adulto. Situação que pode ser considerada equivocada, pois subsidiar o cidadão desde a infância com informação e práticas científicas pode levar um país a ampliar a quantidade e, possivelmente a qualidade de pesquisas,


elevando a probabilidade de interesse pela busca, produção e disseminação científico-cultural.

Assim, a biblioteca escolar precisa se inserir nesse contexto e os mediadores precisam promover ações que incentivem o estudante a pesquisar, buscar informações e planejar experimentos científicos. De maneira que isso venha contribuir na formação de suas habilidades informacionais e seu espírito investigativo, tendo em vista a apropriação da informação científica e a internalização dos conhecimentos científicos. Vale ainda observar, que este estudo representa um ensaio inicial, sendo necessário mais pesquisas, com vistas a ampliar e aprofundar o debate sobre os saberes e suas relações com o processo de alfabetização científica na biblioteca escolar.


REFERÊNCIAS


ALMEIDA JÚNIOR, O. F. Biblioteca pública: ingênua, astuta e crítica. Revista Eletrônica da ABDF, Brasília, v. 5, n. 1, p. 48-67, 16 ago. 2021. Disponível em:

https://revista.abdf.org.br/abdf/article/view/161. Acesso em: 23 fev. 2023.


BORGES, E. V. E. O texto além das palavras: uma visão ampliada da apropriação da informação por meio de textos literários. Brazilian Journal of lnformation Studies: Research Trends, Marília, v.1O, n.1, p.15-24, 2016. Disponível em: https://brapci.inf.br/index.php/res/download/48839. Acesso em: 25 jan. 2023.


BORGES, E. V. E. Apropriação da informação: os elementos, o processo e a materialização da informação. 2018. 256f. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista (UNESP), Marília, 2018.


BOUFLEUER, J. P. Ato cognoscente. ln: STRECK, D. R.; REDIN, E.;

ZITKOSKI, J. J. (orgs.). Dicionário Paulo Freire. Belo Horizonte: Autêntica, 2017.


BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica. Brasília: MEC, SEB, DICEI, 2013.


BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEB, 2010. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/diretrizescurriculares_2012.pdf. Acesso em: 21 fev. 2023.


BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil: conhecimento de mundo. Brasília: MEC/SEF, 1998. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/volume3.pdf. Acesso em: 23 fev. 2023.


BRASIL. Câmara de Deputados. Projeto de Lei 9.484, 2018. Disponível em:https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?cod teor=1639337&filename=PL+9484/2018. Acesso em: 23 fev. 2023.


CARELLI, A. E.; ARAÚJO, L. M.; SANTANA, P. C.; BORTOLIN, S.

Alfabetização científica por meio da mediação oral: uma análise da Revista Ciência Hoje das Crianças. ln: BORTOLIN, S.; SANTOS NETO,

J. A.; SILVA, R. J. Mediação oral da informação e da leitura. Londrina: Abecin, 2015.


CHAPLIN, J. P. Dicionário de Psicologia. Lisboa: Dom Quixote,1981.


CHASSOT, A. Alfabetização científica: uma possibilidade para inclusão social. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n. 22, p.89- 100, 2003. Disponível em:

http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n22/n22a09.pdf. Acesso em: 23 fev. 2023.


FIALHO, J. F.; MOURA, M. A. A Formação do pesquisador juvenil. Perspectivas em Ciência da Informação, Belo Horizonte, v. 1O, n. 2, p. 194-207, 2005. Disponível em:

https://brapci.inf.br/index.php/res/v/36623. Acesso em: 23 fev. 2023.


FREIRE, P. Ação cultural para a liberdade e outros escritos. 7. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. (O mundo hoje, v.1O).


FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. (Coleção leitura).


INTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARIES ASSOCIATIONS

(IFLA). Diretrizes para bibliotecas escolares. 2006. Disponível em: http://www.ifla.org/files/assets/school-libraries-resource­ centers/publications/school-library-guidelines/school-library-guidelines­ pt.pdf. Acesso em: 25 jan. 2023.


MEDEIROS, M. D. F. Indicadores de alfabetização científica em uma aula experimental investigativa sobre fotossíntese e respiração celular para o sétimo ano do ensino fundamental. 2016. 101f.

Dissertação (Mestrado e Ensino de Ciências) - Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2016.


MENDES-DA-SILVA, W. Contribuições e limitações de revisões narrativas e revisões sistemáticas na área de negócios. Revista de Administração Contemporânea, Maringá, v. 23, n. 2, p. 1-11, mar./abr. 2019. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rac/a/XVckWTzvvcX74PZfNTfsGwj/?format=pdf&I ang=pt. Acesso em: 18 nov. 2023.


MENEZES, C. F.; LIRA-DA-SILVA, R. M. Educação científica na primeira infância: o que dizem as Diretrizes Nacionais para a Educação Infantil no Brasil? ln: CONGRESO INTERNACIONAL SOBRE INVESTIGACIÓN EM DIDÁCTICA DE LAS CIENCIAS, 9., 2013, Girona. Anais[...].

Girona: Universitat Autànoma de Barcelona: Universitat de Valência, 2013. p. 1925-1929.


MENKES, M. Políticas públicas em popularização da C&T e divulgação científica. Brasília: Ministério de Ciência e Tecnologia e Inovação. Secretaria de C&T para Inclusão Social. Departamento de Difusão e Popularização de C&T, 2012. Disponível em: http://midiadigital.jor.br/embrapa/simposiojornalismo/apresentacoes/moni ca_mcti.pdf. Acesso em: 23 fev. 2023.


NILSON, L. L.; BOER, N.; FUZER, C. Aspectos que facilitam a sensibilização acerca da sustentabilidade na obra A Chave do tamanho de Monteiro Lobato. lndagatio Didactica, Aveiro, v. 8, n. 1, p. 2008- 2020, 2016. Disponível em: https://proa.ua.pUindex.php/id/article/view/12605. Acesso em: 23 fev.

2023.

PIÉRON, H. Dicionário de Psicologia. 1O. ed. São Paulo: Globo, 1996. PRIMI, R.; SANTOS, A. A. A.; VENDRAMINI, C. M.; TAXA, F.; AUGUST,

F. Competências e habilidades cognitivas: diferentes definições dos mesmos construtos. Psicologia: teoria e pesquisa, Brasília, v.17, n. 2, p.151-159, 2001. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ptp/a/b5tz5SshXNLmnLjRRRKZknN/abstracU?lan g=pt. Acesso em: 23 fev. 2023.


REGO, T. C. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação.

24. ed. Petrópolis: Vozes, 2013. (Educação e conhecimento).


SANTOS NETO, J. A.; BORTOLIN, S.; ALMEIDA JÚNIOR, O. F. A

concepção de apropriação da informação nos periódicos da área "Comunicação e Informação" e Anais de ENANCIB. /n: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO (ENANCIB), 18., 2017, Marília. Anais[...]. Marília:

Unesp, 2017.


SASSERON, L. H.; CARVALHO, A. M. Alfabetização científica: uma revisão bibliográfica. Investigações em ensino de ciências, Porto Alegre, v.16, n.1, p.59-77, 2011. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/844768/mod_resource/contenU1/ SASSERON_CARVALHO_AC_uma_revis%C3%A3o_bibliogr%C3%A1fi ca.pdf. Acesso em: 25 fev. 2023.


SIQUEIRA, C. Projeto adia para 2022 prazo para toda escola ter uma biblioteca. Agência Câmara de Notícias, Brasília, 14 set. 2020.

Disponível em: https://www .camara.leg.br/noticias/692429-projeto-adia­ para-2022-prazo-para-toda-escola-ter-uma-biblioteca/. Acesso em: 23 jan. 2023


VIANA, L. Bibliotecas escolares: políticas públicas para a criação e possibilidades, 2014. 167f. Dissertação (Mestrado em Ciência da

Revista Brasllelra de Educaç3o em Ci nc1a da lnformo

REBECIN


Educação em Ciência da Informação" REBECIN, v. 10, dossiê temático, p.01-29, 2023


Informação)- Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, 2014.