Content curation in distance education: quality management for the development of a reference model
La curación de contenidos en la educación a distancia: gestión de la calidad para el desarrollo de un modelo de referencia
Universidade Fernando Pessoa (UFP)
Portugal
Universidade Fernando Pessoa (UFP)
Portugal
Email: daiana1502@terra.com.br
ROCHA, Daiana Garibaldi da; GOUVEIA, Luís Borges. Curadoria de conteúdo na EAD: Gestão da qualidade para o desenvolvimento de um modelo de referência. REBECIN, São Paulo, v. 9, p. 1-34, 2022. DOI: 10.24208/rebecin.v9.300
Ao transformar informação em conhecimento, a curadoria de conteúdo, por meio de seus diferentes atributos, já vinha se tornando peça fundamental na atuação dos profissionais da Educação a Distância (EAD), e ganhou mais espaço nos últimos dois anos devido à pandemia de Covid-19. Neste artigo, temos como objetivo refletir sobre a conexão entre os conceitos de curadoria de conteúdo e gestão da qualidade e suas contribuições para as áreas da Ciência da Informação e da Educação. Para isso, retomamos os instrumentos de avaliação do Ministério da Educação (MEC) brasileiro e nos aprofundamos na necessidade de composição de critérios e instrumentos que apoiem a referida curadoria, tendo como base indicadores de qualidade. A partir de uma discussão da literatura, recorremos à pesquisa teórica de caráter descritivo e exploratório com vistas a abordar os conceitos de qualidade, gestão da qualidade, autoria, aprendizagem e indicadores de qualidade. Nossas reflexões apontam que estar apto para ser um curador de conteúdo se tornou uma realidade da profissão docente e uma necessidade das instituições de ensino superior, e ainda que o desenvolvimento de um modelo de referência de qualidade para a curadoria de conteúdo na EAD é uma contribuição relevante para essa realidade.
By turning information into knowledge, content curation became a fundamental piece in the work of distance education professionals, gaining more space in the last two years due to the COVID-19 pandemic. This paper aims to discuss the connection between content curation and quality management and its contributions to the areas of Information Sciences and Education. To do that, assessment instruments developed by the Brazilian Ministry of Education are reviewed to expand on the need for composing criteria that support content curation based on quality indicators. A descriptive and exploratory investigation on literature provides means to contemplate the concepts of quality, quality management, authorship, learning, and quality indicators. The discussion indicates that being able to curate content has become part of the educator’s career and a need for higher education institutions and that the
development of a reference model for the quality of content curation in distance education is a meaningful contribution for this context.
Al transformar la información en conocimiento, la curación de contenidos, a través de sus diferentes atributos, ya se ha convertido en una parte fundamental en el desempeño de los profesionales de la Educación a Distancia (EAD), y ha ganado más espacio en los últimos dos años debido a la pandemia del Covid-19. En este artículo pretendemos reflexionar sobre la conexión entre los conceptos de curación de contenidos y gestión de la calidad y sus aportaciones a los campos de las Ciencias de la Información y la Educación. Para ello, retomamos los instrumentos de evaluación del Ministerio de Educación de Brasil (MEC) y profundizamos en la necesidad de composición de criterios e instrumentos que apoyen la referida curaduría, teniendo como base indicadores de calidad. A partir de la discusión de la literatura, recurrimos a investigaciones teóricas de carácter descriptivo y exploratorio para abordar los conceptos de calidad, gestión de la calidad, autoría, aprendizaje e indicadores de calidad. Nuestras reflexiones indican que poder ser curador de contenidos se ha convertido en una realidad de la profesión docente y en una necesidad para las instituciones de educación superior, y que el desarrollo de un modelo de referencia de calidad para la curación de contenidos en la educación a distancia es una contribución relevante a esta realidad.
Uma educação de qualidade na modalidade da Educação a Distância (EAD) deve levar em consideração diversos aspectos, que incluem o acolhimento efetivo dos alunos e a apresentação de sua jornada de estudos por meio de uma metodologia modelada para a sua realidade e alinhada às características e aos valores institucionais.
Também fazem parte dessa composição fatores relacionados à equipe multidisciplinar, como a atualização constante de professores, gestores educacionais, coordenadores de curso e o planejamento dos polos com o acompanhamento das etapas da gestão da qualidade, que deve proporcionar uma melhoria contínua de todo o processo com base na ação-reflexão.
Com base em Moore e Kearsley (2013, p. 2), entendemos que Educação a Distância “é o aprendizado planejado que ocorre normalmente em um lugar diferente do ensino, o que requer comunicação por meio de tecnologias e uma organização institucional especial”. Nesse sentido, diferenciamos a EAD de ensino remoto, ensino remoto emergencial e outras modalidades que têm circulado mais amplamente na conjuntura da pandemia, ressaltando que há polêmica na disputa terminológica estabelecida nos diferentes campos de estudo sobre ensino não presencial, embora não seja essa a discussão que desenvolvemos aqui.
Neste artigo, focalizamos o conceito de “gestão da qualidade”, explorando sua aplicabilidade na área educacional, retomando a origem dos instrumentos de avaliação do Ministério da Educação (MEC) e apontando a necessidade de sua atualização constante, tanto diante da evolução da EAD, das tecnologias aplicadas nessa modalidade e das novas atuações profissionais que surgiram por conta da COVID-19 e da necessidade de isolamento que assolou o mundo de 2019 a 2022 e instigou estudiosos a repensarem a forma de ensinar e aprender na contemporaneidade devido ao contexto provocado pela pandemia.
Os indicadores que compõem os dois documentos de avaliação de cursos (INEP, 2017a, 2017b) estão divididos em três dimensões: Organização Didático-Pedagógica (Dimensão 1), Corpo Docente e
Tutorial (Dimensão 2) e Infraestrutura (Dimensão 3). A primeira delas é a que trata do perfil do egresso, da metodologia, dos conteúdos curriculares e do material didático e está interligada aos processos de curadoria de conteúdo, abarcando os indicadores 1.3, 1.5, 1.6 e 1.18 que tem relevância de análise para a esta pesquisa.
Posicionando o conceito de curadoria apoiamo-nos na proposta de Abbot (2008), que define curadoria digital como o conjunto de atividades que fazem parte do gerenciamento (gestão) de dados, desde o planejamento até a produção de conteúdos, passando pela sua digitalização (para materiais analógicos) ou criação (para os já gerados em meio eletrônico), garantindo a disponibilidade da informação e a sua constante atualização.
Nesse contexto, refletimos sobre os benefícios do estabelecimento de critérios que apoiem a curadoria de conteúdo para a EAD com base nas premissas da Ciência da Informação (CI) e de indicadores de qualidade educacionais que já existem no mercado, mas necessitam de atualização e adaptação frente aos desafios dos novos tempos.
Com a chegada do século XX, por efeitos da globalização, a denominação “sociedade da informação e do conhecimento” ganhou destaque. Freitas (2012, p. 17) afirma que “[...] a caraterística mais marcante desta sociedade é a de considerar a informação como o novo fator de produção, em substituição do modelo anterior assente no trabalho como valor”.
Consideramos, que a partir desse momento, a CI se aproxima significativamente do objeto desta pesquisa e de seu propósito, pois passa a considerar a influência da tecnologia nos contextos sociais, econômicos e culturais, a analisar o seu acelerado crescimento e também, segundo Wersig (1993, p. 235), a “desenvolver modelos,
redefinir interconceitos e cruzar tais modelos e interconceitos na busca de soluções para os problemas causados pela transformação do papel do conhecimento na sociedade humana”.
Essa transformação constante em busca de soluções que possam atender às necessidades da sociedade da informação é reflexo do que se vive hoje em pleno século XXI, quando o uso intensivo das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) leva ao crescimento do digital e à organização da sociedade em rede.
Na Educação não poderia ser diferente, e as transformações vivenciadas nos últimos séculos e impulsionadas pelo século XXI reforçaram a valorização do conhecimento, do capital humano e de sua associação à informação e à comunicação como principal fator de desenvolvimento e evolução.
Dito isso, nosso problema de investigação envolve a curadoria de conteúdo para a EAD, pois constatamos que nem sempre os conteúdos utilizados nesse contexto são selecionados de maneira eficaz, uma vez que são adaptados de outras modalidades de ensino e que não existe um modelo de referência para a realização desse processo.
Quanto a metodologia, do ponto de vista do problema da pesquisa, ela se situa no campo descritivo, que busca compreender como docentes e gestores educacionais conceituam, entendem e caracterizam o processo de curadoria de conteúdo e o relacionam às diferentes dimensões que permeiam o controle de qualidade. Optamos, com base no campo exploratório, ampliar as dimensões de análise elaborando instrumentos de coleta de dados consistentes (questionário e entrevista) que nortearam a construção do modelo de referência de qualidade de curadoria de conteúdo para a EAD.
Tais reflexões e o caminho metodológico fazem parte dos resultados de uma tese de doutorado recentemente defendida que propõe um modelo de referência de qualidade para essa curadoria especializada.
Nos anos 2000, a área da Educação, observando os pontos de qualidade criados para as áreas industriais e empresariais1, inseriu no ensino superior o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), criado em 2004 com o objetivo de avaliar as instituições de ensino, seus cursos, o desempenho dos estudantes e todos os aspectos relacionados a esses eixos, incluindo o tripé acadêmico ensino, pesquisa e extensão (INEP, 2015). Mas antes disso, em 2003, foi elaborada a primeira versão dos Referenciais de qualidade para EAD (BRASIL, 2007), que previa como componentes de avaliação a concepção de educação e o currículo no processo de ensino-aprendizagem, os sistemas de comunicação, o material didático, os métodos de avaliação, a equipe multidisciplinar, a infraestrutura de apoio, a gestão acadêmica e administrativa e a sustentabilidade financeira.
Com as diretrizes estabelecidas pelo Sinaes, houve a necessidade de revisão desses parâmetros, e em 2007 uma nova versão do referido documento foi publicada. Passados cinco anos, em 2012 foi criada, com base nos referenciais anteriores, a primeira versão do Instrumento de
1 Historicamente, o controle de qualidade passou a ser indispensável a partir da Revolução Industrial, marcada, sobretudo, pela padronização de processos. Em 1930, nos Estados Unidos, o desenvolvimento do controle estatístico de processos conferiu cientificidade ao conceito de qualidade, dando origem ao ciclo Plan-Do-Check-Act (PDCA) de melhoria contínua, que se popularizou em 1950. Nos anos 1980, a criação da metodologia Seis Sigma reafirmou a importância do gerenciamento para a redução de custos, e a chegada da norma ISO série 9000 iniciou a era do foco na obtenção da satisfação do cliente.
Avaliação de Cursos de Graduação Presencial e a Distância, documento que passou por novas atualizações em 2015 e em 2017, chegando, assim, à versão atual, dividida em duas partes, que focalizam a autorização de cursos EAD (INEP, 2017a) e seu reconhecimento e renovação de reconhecimento (INEP, 2017b).
Embora os instrumentos de avaliação tenham sido publicados em 2017, Castro, Marques e Serra (2020, p. 26) advertem que eles foram criados com base na segunda versão dos referenciais, e que “[...] não se pode esquecer de que a última versão desse documento é do ano de 2007, portanto, faz-se necessária uma urgente revisão para melhor orientar as IES [Instituições de Ensino Superior]”.
Dito isso, é importante alertar que a gestão da qualidade na Educação, embora usufrua dos conhecimentos advindos da área industrial, precisa ser conduzida de maneira diferente, pois cabe ao professor implementar, julgar e decidir todo o processo de ensino- aprendizagem (ARRUDA, 1997).
Essa adequação tem sido feita por meio da atuação de novos atores, como gestores e equipes interdisciplinares, que, com conhecimentos diversificados, podem qualificar ainda mais a entrega de conhecimento para os alunos, atendendo às duas frentes apontadas nos estudos da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES, 2019): responsabilidade social e melhoria da qualidade.
Embora a contextualização anterior demonstre a progressão do acompanhamento da qualidade da EAD no Brasil por meio da criação de legislação e instrumentos reguladores, ainda muito se discute sobre
parâmetros de qualidade nessa modalidade, principalmente em comparação com a presencial.
Culturalmente, é comum que se questione a diferença entre os diplomas no mercado de trabalho e que haja alguma resistência à aceitação de profissionais formados a distância em conselhos profissionais (BIELSCHOWSKY, 2018; BOSSU, 2009; FILIPPAKOU;
TAPPER, 2008; MARTINS; ZERBANI, 2014; MORAN, 2009). Essa
discussão é necessária para que o tema da qualidade na EAD não se torne utópico, tampouco infundado, afinal, como observam Butcher e Wilson-Strydom (2013, p. 3),
o conceito de qualidade na aprendizagem on-line é tão complexo quanto a própria realidade da aprendizagem on-line. Há uma vasta literatura sobre qualidade no ensino superior, com profusão de termos e conceitos, que muitas vezes identifica uma tensão entre duas funções da garantia da qualidade: como meio de prestação de contas e como caminho para a melhoria da qualidade. (tradução nossa)2
Neste artigo, respeitamos esses questionamentos, mas não pretendemos comparar as modalidades ou identificar suas fragilidades. Nosso intuito é ampliar a discussão sobre as contribuições que a gestão da qualidade pode dar para a EAD, buscando entender mais profundamente o significado de seus conceitos e métodos aplicados à Educação.
2 “The concept of quality in online learning is as complex as the reality of online learning itself. There is a vast literature on quality in higher education, with a profusion of terms and concepts, which often identifies a tension between two functions of quality assurance: as a means of accountability and as a path to quality improvement”.
Bates (2017, p. 433) define a qualidade com enfoque na aprendizagem digital como “métodos de ensino que, com êxito, ajudam os alunos a desenvolver os conhecimentos e as habilidades de que necessitam em uma era digital”. Compreender a aplicabilidade desse conceito de gestão da qualidade no meio educacional não só profissionaliza cada vez mais a oferta de cursos diversos, mas também contribui para que gestores educacionais possam relacionar conhecimentos técnicos e pedagógicos a métodos de controle da qualidade, identificando, assim, possíveis melhorias de processos acadêmicos, tais como a produção de conteúdo, a secretaria acadêmica, o planejamento docente e a própria curadoria de conteúdo.
Nesse sentido, o autor reforça que “métodos de controle de qualidade podem ser úteis para fornecer aos professores novos no ensino com a tecnologia, ou se debatendo com seu uso, modelos de boas práticas para seguirem” (BATES, 2017, p. 437).
O advento das TIC, que impulsionaram e constituíram a sociedade da informação, também traz impactos para a gestão da qualidade na Educação, impondo a necessidade de adaptação e revisão de processos para tornar as instituições mais eficientes e eficazes. Para isso, ter visão sobre planejamento, acompanhamento e melhoria contínua é imprescindível.
No planejamento, todos os conhecimentos teóricos e práticos devem ser considerados, e o perfil do aluno, os objetivos de aprendizagem da trilha a ser percorrida e os recursos e ferramentas a serem utilizados precisam ser mapeados e analisados conforme as expectativas de retorno quanto à aprendizagem. Yang (2010, p. 364, tradução nossa) aponta a responsabilidade dos coordenadores de curso em relação ao planejamento, ressaltando que, “para garantir a qualidade
da educação on-line, os administradores devem exercer funções ativas no planejamento e gerenciamento de programas on-line”. Sendo mais objetivos, Filatro e Cairo (2015, p. 173) sustentam que, “no planejamento da gestão da qualidade, precisamos transformar esses atributos desejados em indicadores e métricas verificáveis”.
Entra em jogo, então, o acompanhamento do plano, que é fundamental para que se complete o ciclo de gestão da qualidade e deve ser realizado com base em critérios e indicadores que possam assegurar a efetividade do planejamento.
Nesse processo, o acompanhamento do professor é central – e desafiador. Visando a qualificação dos cursos EAD, autores como Alley (2001) e Levy (2003) já faziam recomendações importantes a esse respeito, como o incentivo do corpo docente à criação ou seleção de conteúdo para a construção do conhecimento (e não apenas sua memorização), o preparo dos professores para atuar em diferentes tipos de ensino e formas de aprendizagem, o constante treinamento e suporte docente e a verificação de direitos autorais.
Observar essas questões durante a implantação e a execução do planejamento contribui para que a gestão da qualidade garanta o cumprimento do que foi proposto e crie um vínculo de aperfeiçoamento contínuo das práticas instauradas.
Nesse contexto, é importante diferenciar “controle de qualidade” de “garantia da qualidade”. Segundo Nokes e Kelly (2012, pp. 214-215), “o controle interpreta os resultados de testes e medições quando a qualidade difere das metas para determinar as causas e, assim, ajudar a identificar o que pode ser feito para ajustar a qualidade”. Já a garantia da qualidade abarca dois aspectos especiais: “o primeiro é garantir que os objetivos de
qualidade sejam cumpridos; o outro é fazer as partes interessadas confiarem nesse cumprimento” (NOKES; KELLY, 2012, p. 215).
Considerações críticas como as de Filippakou e Tapper (2008), que contestam a diferença entre “garantia” e “melhoria da qualidade” no ensino superior, e análises como as da coletânea de artigos editada por Rosa e Amaral (2014), que abordam as tendências e perspectivas da garantia da qualidade do ensino superior em diferentes continentes do globo terrestre, trazem questões fundamentais para um panorama a respeito desses conceitos, dialogando com os apontamentos de Bates (2017), a principal referência nesse debate. Segundo o autor, os melhores controles de qualidade para um ensino-aprendizagem adequado à era digital são:
a) especialistas nos assuntos bem qualificados e bem treinados em métodos de ensino e uso de tecnologias para o ensino; b) pessoal de apoio altamente qualificado e treinado profissionalmente em tecnologia de aprendizagem; c) recursos adequados, incluindo razões professor/aluno adequadas; d) métodos adequados de trabalho (como trabalho em equipe e gestão de projetos); e) avaliação sistemática levando à melhoria contínua. (BATES, 2017, p. 439)
Isso significa que a gestão da qualidade na EAD precisa garantir o planejamento constante entre gestores e professores, o acompanhamento da execução, que deve estar amparada por equipes multidisciplinares que ofereçam formação continuada e suporte emergencial, e a avaliação contínua do que foi entregue tanto pela gestão e por aqueles que executaram o planejamento (professores e equipes multidisciplinares) quanto pelos que usufruíram sua concretização (os alunos).
Butcher e Wilson-Strydom (2013, p. 6, tradução nossa), no entanto, alertam que “as instituições devem distinguir procedimentos de garantia
de qualidade, que podem facilmente se tornar conformidades, de esforços reais para melhorar a qualidade”.
Em outras palavras: não adianta ter equipes multidisciplinares e processos de gestão da qualidade bem-desenhados se ambos não estiverem alinhados e atentos às melhorias propostas a partir da avaliação, para que, numa próxima oferta de curso, sua execução seja aperfeiçoada. Criar essa rotina de verificação do que deu certo e do que deu errado na gestão da qualidade é fundamental para que a aprendizagem fique mais próxima da realidade do perfil dos alunos da EAD.
No que se refere à aprendizagem, o conteúdo é um dos fatores mais importantes para a garantia da sua qualidade. Por conta disso, a disponibilidade de modelos de gestão da qualidade claros e adequados às realidades da construção e da curadoria de conteúdo contribui não só para a definição e a adoção de indicadores específicos para a EAD, mas também para dar significado a critérios que são fundamentais para essa modalidade de ensino.
A curadoria de conteúdo para a EAD absorve, o conceito de curadoria de conteúdo e incorpora o que de mais relevante se produziu acerca do conceito de curadoria digital. Em resumo, “o próprio termo evidencia isso, uma preocupação especial, um ‘cuidado’ (com a fragilidade dos dados, com a possibilidade de um melhor uso e reuso, etc.) que conduz a uma consideração mais sensível à globalidade dos processos e fenômenos” (ARAÚJO; VALENTIM, 2019, p. 250).
Em um “mundo de excessos”, expressão utilizada por Bhaskar (2020), o papel da curadoria de conteúdo torna-se imprescindível no âmbito educacional. Professores, gestores e profissionais da educação precisam constantemente aprimorar suas habilidades e competências de modo a curar conteúdo para EAD de maneira integral, considerando diferentes dimensões e formas de aprender.
Dessa forma, o papel da curadoria de conteúdo é fundamental na sociedade da informação, na qual o conhecimento tem se confundido com informação e o excessivo e o essencial se separam por uma linha cada vez mais tênue – especialmente no âmbito da EAD, em que o aluno é protagonista de sua aprendizagem, tem acesso infinito à informação e passa a buscar muito além de conhecimento. Para Bhaskar (2020, p. 89), “o valor que você acrescenta não tem só a ver com somar. Tem a ver com excluir o que não é importante nem valioso”. E para excluir, também se requerem as habilidades de triar, avaliar e organizar o conteúdo.
Os indicadores de qualidade são os principais condutores da atuação dos gestores educacionais, pois viabilizam a medição dos resultados obtidos e sua comparação com a meta proposta no planejamento.
Estabelecer esses parâmetros é uma tarefa desafiadora que abrange diferentes aspectos, como registram Morosini et al. (2016, p. 31), após delinearem um conjunto de indicadores para o ensino superior: “A tarefa de produzir indicadores remeteu a desdobramentos em dois planos interligados: o das problematizações conceituais e o das metodologias”.
Todo projeto precisa, fundamentalmente, contar com indicadores de qualidade. Sua construção (ou a implementação de indicadores já existentes), portanto, deve ser uma etapa do planejamento. Eles servirão como balizas para decisões que englobam o que se deseja alcançar do
nível micro ao macro e, inversamente, do global ao local, assim como da área mais pedagógica até a mais administrativa, considerando que em algum momento elas se cruzarão e precisam estar em sintonia.
Franco, Afonso e Longhi (2011) lançam dois princípios que embasam a construção de indicadores de qualidade para o ensino superior: a qualidade metodológica e a qualidade institucional. A qualidade metodológica se destaca não só por contextualizar o conhecimento, mas também por prever a submissão de indicadores à avaliação de especialistas como parte da validação qualitativa de conteúdo.
Essa validação qualitativa do conteúdo acadêmico na EAD faz parte dos indicadores de qualidade do MEC (INEP, 2017a, 2017b), e precisa cada vez mais ser revisada internamente pelas IES como parte do processo de qualificação do percurso de aprendizagem do aluno.
Tendo como base os instrumentos de avaliação do MEC, é necessário que a gestão educacional crie e acompanhe indicadores baseados em métricas de qualidade que deem diretrizes compreensíveis sobre: i. direitos autorais; ii. atualização constante do conteúdo; iii. reciclagem do uso de diferentes recursos e ferramentas educacionais; e
iv. metodologias mais adequadas a cada modalidade de ensino.
O estabelecimento de diretrizes claras de direitos autorais é um indicador de qualidade importante, uma vez que o conhecimento das possibilidades e restrições de uso de conteúdos autorais é imprescindível para quem trabalha com criação, atualização e seleção de conteúdo. Atualmente, a legislação de direitos autorais que vigora no Brasil é regida pela Lei n. 9.610, de 19 de fevereiro de 1998 (BRASIL, 1998).
Ao debater o assunto, Moore e Kearsley (2013, p. 167) afirmam que “o aprendizado on-line torna o respeito aos direitos autorais até mais
problemático, pois é muito fácil copiar e colar texto ou imagens gráficas de um website”. Com o aumento da oferta de cursos EAD, o papel da curadoria de conteúdo se concretiza como parte da gestão da qualidade e de uma atuação profissional que se intensificou com a situação de distanciamento social exigido pela pandemia da COVID-19 nos anos de 2019 a 2022.
Buscando atender aos indicadores de qualidade, curadores de conteúdo devem conhecer as diretrizes de direitos autorais acadêmicos e a diferença entre direitos morais e patrimoniais, bem como saber definir claramente quem é o autor e quais são os dispositivos conexos que respaldam os direitos de intérpretes, o que a legislação protege e o que ela não protege, e qual seu tempo de duração.
As regras não precisam ser decoradas pelo curador, mas é importante que, durante sua atuação profissional, ele se instrumentalize com manuais norteadores que possam ser consultados em caso de dúvida, garantindo, assim, a qualidade e a responsabilidade legal daquilo que está selecionando como conteúdo de aprendizagem.
A atualização constante de conteúdo e a reciclagem de recursos e ferramentas tecnológicas têm relação direta com os direitos autorais, sendo consideradas muito relevantes para a curadoria de conteúdo.
Nesse campo, destaca-se o uso de objetos de aprendizagem e recursos educacionais abertos, pois “uma das maneiras mais fáceis de evitar as complexidades dos direitos autorais é utilizar materiais dos chamados sites de ‘códigos abertos’, nos quais os materiais de aprendizado são compartilhados livremente” (MOORE; KEARSLEY, 2013, p. 168).
Essa prática também é defendida por Butcher e Hoosen (2014, p. 15, tradução nossa), que afirmam que os recursos educacionais abertos
“têm um enorme potencial para melhorar a qualidade, acessibilidade e eficácia da educação, servindo para restaurar uma função central da educação: compartilhar conhecimento”.
No entanto, embora a constante atualização dos recursos didáticos seja fundamental para uma apropriação da aprendizagem, não é uma tarefa simples para o curador de conteúdo, já que por vezes as próprias IES assinam portais com conteúdos protegidos pela lei de direitos autorais.
Algumas instituições, também investem em informação e capacitação para que os professores curadores possam realizar suas atividades considerando os requisitos de qualidade e a garantia da legislação.
As pesquisas de Branco (2011, 2014, 2017), uma referência em direitos autorais no Brasil e também um crítico do patrimonialismo, contribuem substantivamente para instrumentalizar autores, professores e curadores sobre o assunto.
Os estudos do autor buscam contextualizar o respeito aos direitos intelectuais nas mudanças advindas da sociedade da informação, tais como os comportamentos da sociedade em rede (CASTELLS, 2003) e da inteligência coletiva (LÉVY, 1999), defendendo o direito de acesso ao conhecimento em prol da educação (BRANCO, 2015). A própria curadoria, em sua essência, é um meio de interligar informação, conhecimento e autoria, indicando conteúdo por meio de fontes seguras e originais para aqueles que estão aprendendo.
Suas reflexões são voltadas para a necessidade de atualização da legislação, aproximando-a da realidade comunicacional em que a internet se torna um meio de colaboração e disseminação de conhecimento.
Nesse sentido, o Creative Commons3, segundo Branco e Britto (2013), provoca a implantação de um novo modelo de direito autoral, em direção a um mundo no qual os conhecimentos circulem mais livremente. Defendendo o projeto, os autores pontuam que ele busca o equilíbrio entre as tecnologias, as práticas sociais e a manutenção da proteção dos autores que a atual legislação ainda não oferece.
Na área da Educação, a identificação da licença Creative Commons já é considerada uma prática de gestão da qualidade de quem faz a curadoria conteúdos abertos, como observa Bates (2017, p. 413):
quando procurar por possíveis recursos educacionais abertos na web, confira para verificar se o recurso tem ou não uma licença Creative Commons ou uma declaração dando permissão para reutilização. Pode ser prática comum usar recursos livres (sem custo) sem nenhuma preocupação sobre direitos autorais, mas há riscos se não há licença clara ou permissão para reutilização.
As ferramentas antiplágio são um recurso importante, pois auxiliam revisores de conteúdo e curadores na etapa de confirmação da autoria de conteúdos que não estejam claramente licenciados, contemplando ainda o indicador de credibilidade do conteúdo.
Os indicadores de qualidade que preveem a aplicação de metodologias diversificadas, que contemplem as formas específicas de aprendizagem na EAD, também contribuem para o fortalecimento do campo pedagógico e o processo de qualificação da educação.
Em suma, a curadoria de conteúdo mapeada a partir de indicadores gerados por um processo de gestão da qualidade torna-se uma
3 Creative Commons (https://br.creativecommons.net/) é um projeto gerido sem fins lucrativos por uma organização não governamental sediada em São Francisco, na California, e é hoje um dos principais movimentos que impulsionam uma possível reforma na lei de direitos autorais, que por vezes é dúbia e distante das características da sociedade da informação.
oportunidade para a “educação digital, que não foca mais somente no conteúdo em si, mas em como os temas são ensinados e como acontece a experiência do estudante, chancelando a qualidade do que é ofertado” (TAVARES et al., 2021, p. 66).
À medida que a composição do conteúdo se concretiza com a aplicação da metodologia e a experiência do aluno, é possível analisar a eficiência e a eficácia do processo para promover as mudanças necessárias em uma próxima oferta, completando o ciclo da gestão da qualidade de planejamento, acompanhamento e melhoria contínua.
No entanto, para que haja esse aperfeiçoamento constante, é necessária a atualização dos documentos norteadores do MEC, seus referenciais e instrumentos (CASTRO; MARQUES; SERRA, 2020), de forma a disponibilizar indicadores mais claros, objetivos e próximos da transformação pela qual a EAD passou nos últimos anos, considerando, por exemplo, a multiplicidade de recursos e ferramentas tecnológicas, o uso de recursos educacionais abertos e as próprias práticas de curadoria de conteúdo, tão necessárias atualmente, priorizando a interação do docente com o aluno e a especialização dos novos perfis profissionais.
Cabe evidenciar, nesse sentido, que o processo de melhoria contínua visa a instauração de boas práticas que culminem na eficiência, na eficácia, na escalabilidade e no reuso de todo conteúdo mapeado, atualizado, revisado e metodologicamente aplicado.
Quanto maior o número de profissionais aptos a atuarem na curadoria, mais os ambientes e repositórios devem estar preparados para concentrar e organizar conteúdos educacionais, com o objetivo de “redução do tempo do professor para a criação de materiais”, de modo que possa usar seu tempo “mais no apoio à aprendizagem do aluno que em entrega de conteúdo” (BATES, 2017, p. 424). Os procedimentos de
qualidade visam, portanto, melhorar desempenhos futuros por meio de indicadores, e não julgar processos infundados ou falhos.
Na prática de curadoria de conteúdo, procedimentos formais internos de avaliação e seleção do conteúdo devem se tornar rotinas lideradas por gestores com diferentes perfis. Se realizada com poucos requisitos a serem seguidos – ou nenhum, como ocorre frequentemente –, a curadoria pode anular o potencial original do conteúdo.
Segundo Vernadat (1996), um modelo de referência, parcial ou completo, pode ser usado como base para o desenvolvimento, a avaliação ou a estruturação de modelos similares, complementares ou particulares. Para Behar (2009, p. 21), “modelo é um sistema figurativo que reproduz a realidade de forma mais abstrata, quase esquemática, e que serve de referência”.
Num contexto em que o objetivo é direcionar a curadoria de conteúdo para a aprendizagem do aluno EAD, o modelo não se define como uma receita, um processo engessado que precisa ser seguido linearmente sem considerar variáveis locais, mas sim um ponto de partida, um fio condutor que pode apoiar o início de uma trajetória fundada em estudos que já apresentam resultados.
Considerando esse cenário e o conjunto de leituras, análises e estudos realizados no decorrer da pesquisa, sendo alguns apresentados nas seções anteriores desse artigo, inspiramo-nos também nos processos de curadoria resumidos na pesquisa de Chagas (2018) que sugere seis etapas que um modelo de curadoria de conteúdo deve
contemplar: identificar (relacionada ao planejamento), buscar (relacionada aos tipos de busca), selecionar (relacionada a critérios de separação), dar sentido (relacionada à contextualização), compartilhar (relacionada aos tipos de publicação) e avaliar (relacionada à retroalimentação e atualização).
O modelo de referência de qualidade para a curadoria de conteúdo na EAD que desenvolvemos (Figura 1) conecta quatro dimensões fundamentais para completar o ciclo de qualidade dessa curadoria: dimensão de curadoria, pedagógica, tecnológica e de qualidade. Estas se interligam por meio das fases exploratória, de desenvolvimento e empírica, e são constituídas de cinco ou seis categorias.
O modelo é um mapa para contribuir no percurso de criação dos indicadores e contribuir na construção de um checklist para identificar se as diretrizes foram cumpridas.
Ou seja, em cada dimensão, as categorias indicadas são relevantes para balizar e impulsionar a criação de indicadores que contribuirão para a concepção interna da curadoria de conteúdo para a EAD nas IES.
As fases de interligação realizam conexões que auxiliarão os gestores (com suas equipes multidisciplinares) a operar a curadoria de conteúdo em suas IES com maior segurança conceitual, técnica e de aplicabilidade, considerando as exigências dos instrumentos de avaliação do MEC.
Na fase exploratória, abarcamos duas dimensões: a de curadoria e a pedagógica. Na dimensão de curadoria, o esforço inicial deve se concentrar na formação continuada dos professores curadores e da equipe multidisciplinar, para que possam compreender o significado do termo “curadoria” aplicado na educação e o valor que o processo agrega à aprendizagem dos alunos se as etapas da curadoria de conteúdo forem cumpridas da maneira mais completa possível, considerando as características necessárias ao professor curador e as responsabilidades da equipe multidisciplinar durante o processo.
Cabe lembrar que não há indicações definidas e engessadas a serem seguidas por todas as IES, que devem implementar o processo a partir de suas identidades. Também é importante ressaltar que não se pode pressupor que todos saibam o que significa curadoria, o que faz cada um dos atores e quais as características necessárias ao profissional que executará cada função, as quais, embora possam parecer óbvias, não o são, e devem, portanto, ser abordadas e customizadas por meio de formações continuadas dentro das IES para que se alcance um fluxo de melhoria contínua e o amadurecimento da atividade profissional.
Além disso, facilitar a interpretação da legislação dos direitos autorais e compilar ferramentas ou definir uma específica que possa auxiliar os professores curadores a garantir a fidedignidade do conteúdo selecionado também são ações que fazem parte dessa dimensão, que deve ainda sugerir modelos de gestão de conhecimento que prevejam a quantidade de conteúdo a ser selecionado conforme a modalidade de ensino e as metodologias previstas, a identificação do processo de atualização do conteúdo (acompanhando as últimas versões publicadas e os ajustes realizados) e as formas de busca (uso de palavras-chave, operadores booleanos e tagueamento), que contribuirão para as fases de desenvolvimento e empírica.
Na dimensão pedagógica, o esforço segue direcionado à capacitação contínua dos professores com perfil adequado à atuação na curadoria de conteúdo, focalizando sua especialização nos aspectos pedagógicos relacionados à seleção do conteúdo a partir de objetivos de aprendizagem que deixem claras as competências a serem alcançadas pelos alunos durante o seu percurso de aprendizagem.
Para isso, é fundamental que eles compreendam como conteúdos didáticos diversos são construídos, quais são suas características, como
devem ser avaliados e com qual propósito devem ser selecionados e indicados para os alunos, sempre levando em consideração a definição da modalidade de ensino prevista nos documentos institucionais (como o Projeto Pedagógico do Curso – PPC) e a organização desse processo no tempo de planejamento docente.
Também é importante que estejam claras para todos os atores suas responsabilidades, definindo-se se um profissional executará todas as etapas da curadoria ou se trabalhará em parceria com a equipe multidisciplinar, por exemplo.
Em suma, nessa primeira fase de interligação (a exploratória), o modelo propõe atenção redobrada para a precisão e a atualização dos conteúdos, sua validade e autenticidade, e o atendimento das necessidades de aprendizagem dos alunos, pontos que precisam estar na lista de checagem dos curadores.
Para que esse processo funcione, a contextualização pedagógica precisa estar bem-desenhada na metodologia da IES, adequando e integrando os conteúdos à realidade dos alunos desde o planejamento micro até a sua concepção macro.
Na fase de desenvolvimento, já consideramos vencidas as etapas de mapeamento do conteúdo autoral e cumprimento dos requisitos pedagógicos. Agora, a curadoria deve ficar atenta aos recursos tecnológicos básicos que serão utilizados como instrumentos de apoio para a aplicação do conteúdo.
Isso significa que os curadores devem ter formação sobre as tecnologias de informação e comunicação (TIC) que permita a seleção de ferramentas adequadas à apresentação dos conteúdos de forma alinhada à metodologia da IES, definida em seu PPC e explorada na dimensão
pedagógica, as quais devem possibilitar o acompanhamento das métricas de estruturação, utilização e avaliação do conteúdo.
Assim, as dimensões tecnológica e pedagógica não só concretizam conjuntamente a fase de desenvolvimento, mas também são o cerne da curadoria de conteúdo para a EAD.
A dimensão tecnológica abrange a inteligência de dados, que pode ser viabilizada por meio de ferramentais e recursos abertos já existentes, como bancos de artigos ou repositórios de Objetos de Aprendizagem (OA). Além dos recursos abertos, é relevante considerar o número crescente de EdTechs4 que oferecem bibliotecas virtuais, portais de conteúdo digital com foco no ensino superior, laboratórios virtuais e de realidade virtual e aumentada.
A aquisição de pacotes com ferramentas diversas pelas IES potencializa a curadoria, complementando os conteúdos a serem disponibilizados e até mesmo eliminando etapas do processo.
As trilhas de aprendizagem e o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) são os principais recursos a serem definidos. São eles que permitem a customização dos cursos e constroem a identidade da IES. A atuação do gestor na definição e administração desses recursos e ferramentas é, portanto, crucial para o bom andamento do processo de curadoria de conteúdo, assim como a identificação do perfil dos curadores com competências digitais para trabalhar com essas plataformas.
Por fim, a terceira e última fase é a empírica, aquela que, por meio de uma lista de checagem final baseada em indicadores previamente estabelecidos, verifica a abrangência do atendimento de todos os critérios
4 Abreviação de education technology, ou tecnologia educacional: são soluções que integram tecnologia com a jornada dos stakeholders da educação (professores, alunos, administradores).
estipulados para a curadoria de conteúdo, registrando como melhoria contínua os pontos que ainda precisam ser reforçados ou revistos na gestão da qualidade. Esse processo se reinicia sempre que houver necessidade de mapear possíveis falhas a serem corrigidas.
A dimensão da qualidade utiliza os dados gerados pela dimensão tecnológica tanto no momento de seleção dos conteúdos e repositórios e de construção da trilha pelo professor curador quanto no acompanhamento posterior por meio dos mecanismos do AVA, que permitem identificar passo a passo a trilha percorrida pelo aluno e os objetos em que ele demorou mais tempo consumindo conteúdo.
Essas informações contribuem para que a gestão possa organizar ambientes mais escaláveis, reusáveis e atualizados, vislumbrando uma economia de tempo na atuação do professor curador.
Contar com uma equipe multidisciplinar disposta a apoiar esse professor acompanhando indicadores de qualidade já existentes no mercado que auxiliem a curadoria é relevante não só do ponto de vista da gestão do conhecimento, mas também como uma proposta norteadora de todo o processo.
Diante desse desafio, o processo de curadoria de conteúdo para a EAD apresentado no modelo acima pressupõe um trabalho complexo, que precisa ser acompanhado pela gestão. A presença de uma equipe multidisciplinar contribui para uma realização eficiente e eficaz de todas as etapas, o embasamento das decisões do curador a partir de um desenho claro da produção do conteúdo e o acompanhamento das etapas de controle de qualidade e melhoria contínua.
Neste artigo, apresentamos uma breve revisão do conceito de gestão da qualidade com o intuito de compreender sua aplicabilidade no campo educacional, especialmente na EAD, e defendemos a importância da atualização dos documentos regulatórios que regem a qualidade dessa modalidade no país.
As ponderações feitas a esse respeito endereçaram a escrita para a importante relação entre a autoria e o papel da gestão da qualidade, e nos levaram a apontar a necessidade de os gestores educacionais criarem indicadores institucionais claros para a curadoria de conteúdo que contemplem conhecimentos básicos de direitos autorais (tradicionais e abertos), recursos, ferramentas e metodologias que garantam a aprendizagem dos alunos, visando um fluxo contínuo de melhoria das práticas de revisão desses indicadores.
Vale ressaltar que as relações de aproximação entre a CI, a sociedade da informação e do conhecimento e, por fim, a área educacional, apontadas brevemente nesse artigo, buscam reforçar que se a CI, sob a ótica de Borko (1968, pp. 3-5), “[...] é a disciplina que investiga as propriedades e o comportamento informacional, as forças que governam os fluxos de informação, e os significados do processamento da informação, visando à acessibilidade e a usabilidade ótima”, as investigações realizadas em seu âmbito requerem abordagens metodológicas múltiplas para se desenvolverem.
Ajudam, assim, a buscar novas formas de solucionar desafios (como os da curadoria educacional) procedentes da sociedade da informação, na qual tecnologias e conhecimentos se complementam,
problematizando e constituindo a base organizacional das relações pós- modernas.
A compilação das etapas mais significativas da curadoria, combinada com as dimensões e categorias do modelo de referência de qualidade apresentado sintetiza, assim, as características necessárias para uma curadoria de conteúdo adequada à modalidade EAD que tenha como foco o perfil do aluno, reforçando a abordagem inovadora deste estudo para o campo da CI.
Acreditamos que modelos de referência possibilitam a compreensão do processo de maneira integrada, evidenciando suas diferentes variáveis com uma visão estratégica, processual e de recursos. Permitem, ainda, relacionar teoria e prática, fazer a gestão do conhecimento, definir uma base de diagnóstico do processo e simular, definir e garantir o fluxo de informações.
À medida que as diferentes modalidades de ensino se cruzam e parecem cada vez mais se complementarem, o papel dos profissionais do ensino superior também é instigado a se reinventar, surgindo, assim, novas possibilidades de atuação profissional.
Esse cenário leva a refletir sobre a multidisciplinaridade da CI e sua aproximação com a área da Educação, o que foi extremamente significativo para estreitar as relações conceituais desta pesquisa com o seu objeto, a curadoria de conteúdo para EAD, considerando a influência da tecnologia nos contextos social, educacional, econômico e cultural, assim como o seu acelerado desenvolvimento.
Buscando respeitar a realidade educacional brasileira, o modelo de referência proposto traz à luz um objeto de pesquisa atual que relaciona conhecimentos transversais das áreas de CI e Educação, com vistas a ressaltar a relevância de uma maior conexão entre os conceitos das duas
áreas por meio dos benefícios que a curadoria pode trazer para a estrutura de criação de conteúdos pedagógicos e gestão da qualidade, assim como aumentar o fomento da discussão sobre curadoria de conteúdo no contexto educacional.
Contribui, portanto, para a ampliação das produções científicas sobre curadoria de conteúdo, visto que a escassez de pesquisas sobre o tema na Educação é uma das maiores limitações do estudo.
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