Princípios educacionais de Paulo Freire na docência universitária em Biblioteconomia

 

Educational principles of Paulo Freire in University Teaching in Librarianship

 

Los principios educativos de Paulo Freire en la enseñanza de la biblioteconomia

 

 

Jorge Santa Anna

Universidade Federal de Minas Gerais

Brasil

 

 

 

 

Submetido em: 20/06/2021

Aceito em: 30/11/2021

Publicado em: 31/12/2021

 

Licença:

 

 

Autor para correspondência: Jorge Santa Anna

Email: jorjao20@yahoo.com.br

ORCID:

 

 

 

Como citar este artigo:

 

SANTA ANNA, Jorge. Princípios educacionais de Paulo Freire na docência universitária em Biblioteconomia. REBECIN, São Paulo, v. 8, p. 01-34, 2021. DOI:  10.24208/rebecin.v8i.286

 

RESUMO

A docência universitária exercida na Graduação em Biblioteconomia requer um conjunto de habilidades técnico-pedagógicas, das quais muitas delas nem sempre são exploradas durante a formação inicial do docente, sobretudo as de cunho pedagógico. Esse contexto problematiza a necessidade do fazer docente considerar princípios educacionais, de modo a fortalecer o ensino-aprendizagem solicitado no percurso formativo do bibliotecário. Partindo do pressuposto de que as práticas educativas assumiram novos rumos a partir do legado constituído pelo educador Paulo Freire, faz-se necessário identificar a aplicação dos princípios postulados por esse autor no fazer do docente de Biblioteconomia, sendo esse o principal objetivo deste estudo. Além disso, o estudo apresenta o panorama da prática docente no curso de Graduação em Biblioteconomia; sistematiza os princípios freireanos e as atitudes a eles vinculadas; e correlaciona esses princípios com as práticas pedagógicas que permeiam os cursos de formação do bibliotecário. De natureza qualitativa, o estudo recorre à pesquisa bibliográfica, mediante a consulta a artigos publicados sobre docência em Biblioteconomia, e à análise de conteúdo, a fim de sintetizar as propostas freireanas, que revelam novos caminhos para a educação. Os resultados indicaram que a prática docente recorre aos princípios humanos e sociais, não sendo explorados os princípios democráticos. Por essas evidências, percebeu-se a necessidade da adoção de estratégias pedagógicas que possibilitem uma educação mais crítica, emancipatória e interventiva, de modo a encorajar o bibliotecário ao exercício profissional e fortalecer o reconhecimento e atuação da Biblioteconomia na sociedade.

 

Palavras-Chave: Docência universitária; Graduação em Biblioteconomia; Estratégias pedagógicas; Princípios de Paulo Freire.

 

 

ABSTRACT

The university teaching exercised in Undergraduate Library Science requires a set of technical-pedagogical skills, many of which are not always explored during initial teacher training, especially those of a pedagogical nature. This context problematizes the need for the teacher to consider educational principles, in order to strengthen the teaching-learning required in the librarian's training path. Assuming that educational practices took new directions from the legacy constituted by the educator Paulo Freire, it is necessary to identify the application of the principles postulated by this author in the doing of the Librarianship teacher, which is the main objective of this study. In addition, the study presents an overview of teaching practice in the Undergraduate Course in Library Science; systematizes the Freirean principles and the attitudes linked to them; and correlates these principles with the pedagogical practices that permeate librarian training courses. Qualitative in nature, the study uses bibliographic research, by consulting published articles on teaching in Library Science, and content analysis, in order to synthesize Freire's proposals, which reveal new paths for education. The results indicated that teaching practice resorts to human and social principles, with democratic principles not being explored. Based on these evidences, the need to adopt pedagogical strategies that allow for a more critical, emancipatory and interventionist education was perceived, in order to encourage librarians to practice professionally and strengthen the recognition and performance of Librarianship in society.

 

Keywords: University teaching; Graduation in Library Science; Pedagogical strategies; Principles of Paulo Freire.

 

RESUMEN

La enseñanza universitaria en Biblioteconomía requiere un conjunto de competencias técnicas y pedagógicas, muchas de las cuales no siempre se exploran durante la formación inicial de los profesores, especialmente las de carácter pedagógico. Este contexto plantea la necesidad de que el proceso de enseñanza considere los principios educativos para fortalecer la enseñanza-aprendizaje requerida durante la formación del bibliotecario. Partiendo de la base de que las prácticas educativas han tomado nuevos rumbos a partir del legado de Paulo Freire, es necesario identificar la aplicación de los principios postulados por este autor en el trabajo del profesor de Biblioteconomía, lo que constituye el objetivo principal de este estudio. Además, el estudio presenta el panorama de la práctica docente en el curso de pregrado de Bibliotecología; sistematiza los principios freireanos y las actitudes vinculadas a ellos; y correlaciona estos principios con las prácticas pedagógicas que permean los cursos de formación bibliotecaria. Este estudio cualitativo recurre a la investigación bibliográfica mediante la consulta de artículos publicados sobre la enseñanza en Biblioteconomía y el análisis de contenido para sintetizar las propuestas freireanas, que revelan nuevos caminos para la educación. Los resultados indicaron que la práctica docente recurre a los principios humanos y sociales, no explorándose los principios democráticos. Por estas evidencias, se constató la necesidad de adoptar estrategias pedagógicas que posibiliten una educación más crítica, emancipadora e intervencionista, a fin de incentivar al bibliotecario al ejercicio profesional y fortalecer el reconocimiento y desempeño de la Bibliotecología en la sociedad.

 

Palabras clave: Enseñanza universitaria; Licenciatura en Biblioteconomía; Estrategias pedagógicas; Principios de Paulo Freire.

 

1 INTRODUÇÃO

 

A formação profissional do bibliotecário exige dos docentes universitários um conjunto de habilidades específicas que possibilitem aos alunos a aquisição de conhecimentos inerentes à área da Biblioteconomia. Isso quer dizer que o conhecimento técnico será alcançado à medida que os docentes desenvolvam habilidades sobre a prática bibliotecária, aplicando-as na condução das aulas.

Todavia, a prática da docência, em qualquer contexto que seja aplicada, não se limita, apenas, às habilidades técnicas de um fazer profissional. É requerido, também, o domínio de habilidades pedagógicas que possibilitarão o ensino-aprendizagem. Tais habilidades são comumente trabalhadas nos cursos de licenciatura, visto que o foco desses cursos é a prática pedagógica. Assim, os docentes, cuja formação inicial não passou pela licenciatura, precisam aprimorar seus conhecimentos, tendo em vista fortalecer sua prática docente, exercendo-a com integridade, ou seja, aplicando habilidades técnicas e pedagógicas.

Partindo do pressuposto de que a atuação docente será íntegra quando convergir o conhecimento específico da área que o docente leciona e quando ele adquirir habilidades voltadas à garantia do ensino-aprendizagem, presume-se que esse seja um desafio premente nos cursos de Graduação em diversas áreas do conhecimento, sobretudo no Brasil. No caso do docente de Biblioteconomia, acredita-se que ele precisa ter habilidades técnico-pedagógicas, embora, na maioria das vezes, as de cunho pedagógico não tenham sido trabalhadas em sua formação inicial.

Portanto, é importante que os docentes procurem conhecer os princípios da prática docente, ou seja, as orientações de como conduzir o processo de ensino-aprendizagem, recorrendo a uma variedade de recursos, atividades e metodologias pedagógicas. Além desses elementos, a relação aluno e docente é um fator muito importante, pois fortalece a comunicação, haja vista a garantia de aprendizado alinhado às necessidades de cada aluno e aos anseios da sociedade.

Quando se trabalha com princípios ou fundamentos da prática pedagógica, diversos autores vêm à tona, sobretudo as reflexões propostas pelo educador Paulo Freire, em meados do século XX. Paulo Freire, segundo Maciel (2011), é considerado uma referência nacional e internacional na área da Educação, em especial por ter formulado princípios essenciais que deram novos rumos à educação, desmistificando o paradigma centralizado no professor para o paradigma da troca de conhecimentos, ou seja, de uma educação bancária para uma educação emancipatória, haja vista possibilitar a mudança social.

Na visão de Saul e Saul (2016), o educador em apreço deixou um legado para todos os segmentos educacionais, incluindo-se a docência universitária. No âmbito universitário, segundo os autores, os princípios freireanos encontram um terreno fértil de aplicação, visto o papel assumido pela universidade, que se coloca “[...] a favor da construção de um conhecimento crítico-transformador, na direção de uma sociedade democrática, justa e solidária, que transborda e penetra a estrutura e o funcionamento de uma instituição de ensino superior” (SAUL; SAUL, 2016, p. 72).

Considerando que a docência universitária exercida na Graduação em Biblioteconomia precisa estar em constante aprimoramento, tendo em vista a formação de profissionais mais dinâmicos e engajados com as causas sociais, como pontuado no estudo de Santa Anna (2020), é pertinente discorrer sobre os princípios freireanos e o que eles podem potencializar para a prática pedagógica. A docência, nesse contexto, perpassa “[...] pela consciência do sujeito sobre o verdadeiro papel do professor na sociedade, e, sobretudo, pelo conhecimento dos saberes pedagógicos e didáticos [...]” (DINIZ; ROCHA, 2013, p. 152, grifo nosso).

Portanto, questionam-se quais são esses princípios, as atitudes que eles possibilitam e se estão sendo adotados no processo formativo inicial do bibliotecário. Com efeito, o objetivo geral deste estudo é identificar a aplicação dos princípios postulados por Paulo Freire no fazer do docente de Biblioteconomia. Dentre os objetivos específicos, citam-se: 1 - apresentar o panorama da prática docente no curso de Graduação em Biblioteconomia; 2 - sistematizar os princípios freireanos e as atitudes a eles vinculadas; e 3 - correlacionar esses princípios com as práticas pedagógicas que permeiam os cursos de formação do bibliotecário.

O tema relatado neste estudo é relevante por fornecer orientações básicas de como melhorar as aulas que são oferecidas aos alunos da Graduação em Biblioteconomia. Além de servir como insumo para o fazer do docente, a discussão apresentada pode fornecer dicas a outros personagens envolvidos com o percurso formativo do bibliotecário, como os coordenadores de curso e das unidades acadêmicas, quando da estruturação dos currículos e dos projetos políticos pedagógicos.

 

2 DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA NA FORMAÇÃO INICIAL DO BIBLIOTECÁRIO: DESAFIOS E PERSPECTIVAS

 

A docência universitária no contexto dos cursos de Graduação em Biblioteconomia, no Brasil, é permeada por muitos desafios, sobretudo pela maioria dos docentes não terem formação em licenciaturas. Essa realidade faz com que o corpo docente busque se especializar, adotando estratégias que tornem as aulas mais dinâmicas, de modo que as práticas de ensino vão sendo construídas na própria sala de aula (EGGERT-STEINDEL, 2002).

Considerando que o fazer docente está em constante construção, como discorrido por Eggert-Steindel (2002), entende-se que conhecer os fundamentos que sustentam a prática educativa é condição básica para a docência (DINIZ; ROCHA, 2013). Os fundamentos ou princípios educacionais constituem a base norteadora, ou seja, orienta a prática educativa, que precisa ser embasada na liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tendo como finalidade principal “[...] o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho [...]” (BRASIL, 1996).

A partir dos fundamentos que alicerçam a prática educativa, são determinadas atitudes a serem assumidas por alunos e docentes no decorrer do processo de ensino-aprendizagem. Tais atitudes se concretizam por meio de estratégias diferenciadas, que possibilitam o aprendizado mútuo, considerando habilidades técnicas ou pedagógicas, as quais, em conjunto, promoverão um trabalho educativo “[...] que discuta e habilite o jovem para entender os novos códigos simbólicos que qualificam uma sociedade que se informatiza, se tecnifica, se organiza dinamicamente em várias de suas atividades” (SILVEIRA, 2005, p. 1).

Além da liberdade e da solidariedade serem princípios básicos, diversos outros princípios foram formulados para garantir o fortalecimento da docência, como os formulados por Paulo Freire. Os fundamentos freireanos são revolucionários, no sentido que estimulam docentes e alunos a reconhecerem as suas potencialidades para a transformação da realidade. Com essas bases, “[...] há o desejo de encontrar um ser totalmente capaz de argumentar e expor o que a ele está sendo apresentado em sua formação, podendo contribuir com seu conhecimento diário [...]” (FONTANELLA; BITTENCOURT, 2018, p. 213).

Na área da Biblioteconomia, Santa Anna (2018) destacou a importância desses princípios para o aprimoramento do fazer docente, ao mesmo tempo em que o próprio aluno se beneficia quando é estimulado a reconhecer o seu potencial junto à sociedade. O autor destacou como princípios orientadores da docência universitária: o diálogo, a interação, o respeito, o compartilhamento e, principalmente, o estímulo à pesquisa. Embora esses princípios venham sendo adotados, o autor constatou a existência de alguns desafios a serem superados, sobretudo o modo incipiente como a pesquisa é conduzida na sala de aula.

A prática da pesquisa, no Brasil, está atrelada à Pós-Graduação, o que gera certo distanciamento das estratégias investigativas na formação inicial dos profissionais, em diversas áreas do conhecimento. Na Biblioteconomia não é diferente, cujos projetos pedagógicos mencionam a prática da pesquisa, mas sem elucidar um direcionamento que como o docente deve proceder. Portanto, faz-se necessária a oferta de uma formação que possibilite ao graduando “[...] ser um profissional crítico, reflexivo, ético e com habilidades e competências para atuar sobre os problemas que o cerca, tanto no campo profissional como social” (JESUS; SILVA, 2011, p. 13).

A busca por um fazer docente que seja completo, ou seja, que viabilize uma formação consistente e adequada dos alunos é uma missão complexa, que requer atitude, compromisso e, sobremaneira, criatividade. Ao pensar em uma prática docente responsável e inovadora, Bernardi e Ramos (2020) relataram a importância dos estágios docentes, cujos envolvidos refletirão, em conjunto, e mediante uma relação dialógica, a práxis pedagógica, a atuação no ensino a distância e a necessidade do constante diálogo e das interações, tanto entre os próprios docentes, quanto entre docentes e discentes.

Araújo e Leal (2012) perceberam que a docência universitária exercida na Graduação em Biblioteconomia exige um conhecimento técnico, o que leva os docentes a adotarem ferramentas tecnológicas que evidenciam a prática profissional, sobretudo em disciplinas técnicas. Assim, os autores recomendam a necessidade de unir teoria e prática, com o fim de “[...] incentivar os discentes a estabelecer processos reflexivos que irão contribuir para a sua formação profissional e como cidadão, membro de uma sociedade em constante processo de mudança” (ARAÚJO; LEAL, 2012, p. 110).

A adoção de estratégias que estimulem a aquisição de habilidades técnicas permeia o contexto de muitas disciplinas do curso de Biblioteconomia, tais como as disciplinas de representação da informação. Na representação descritiva, por exemplo, docentes estimulam alunos a estarem em constante capacitação, para que possam acompanhar “[...] as atualizações das regras, modelos e formatos que permeiam as atividades do bibliotecário catalogador” (LOURENÇO et al., 2020, p. 71).

Mesmo diante de disciplinas técnicas, a docência pode ser conduzida de modo mais atrativo e, ao mesmo tempo, possibilitando mais contato do aluno com a realidade prática do fazer profissional. Assim, as habilidades exigidas do docente são variadas, como domínio do assunto, diálogo, criatividade, interação, dentre outras, e dependem da capacidade desse profissional oferecer os conteúdos das disciplinas, de modo que eles possam ser apropriados pelos alunos, agregando valor aos contextos onde estão inseridos (FERREIRA, 2000).

Nesse caso, segundo Santa Anna (2019), as visitas técnicas e guiadas funcionam como importantes aliadas do fazer docente, principalmente quando se trata de disciplinas técnicas do curso.

[...] As visitas técnicas funcionam como instrumentos pedagógicos que provocam a motivação e engajamento dos participantes com o aprendizado, como também promovem a identificação e a visibilidade das práticas de catalogação em acervos bibliográficos. Em síntese, as visitas muito contribuem com o lecionamento de disciplinas técnicas, como a catalogação de documentos, proporcionando a fusão entre teoria e prática; entre sala de aula e mercado de trabalho (SANTA ANNA, 2019, p. 1).

 

Além das visitas técnicas, atividades práticas podem ser realizadas nas salas de aula, mediante o acesso aos instrumentos educacionais digitais. Com os recursos da web 2.0, por exemplo, é possível ampliar a interação, colaboração, participação e o engajamento dos alunos com as disciplinas. Por um lado, essas tecnologias fortalecem o ensino-aprendizagem, e por outro requerem a aquisição de novas habilidades por parte dos docentes, como capacidade de uso, criatividade, dentre outras. Portanto, “[...] pensar a educação no contexto de uma constante evolução tecnológica altera de forma significativa as práticas pedagógicas e exige uma postura de contínua reformulação do trabalho docente” (ARAÚJO, 2013, p. 129).

O autor citado destaca que o cenário tecnológico coloca o fazer docente em uma encruzilhada, no sentido de que novos caminhos são traçados, oportunizando benefícios para o ensino-aprendizagem, desde que habilidades sejam desenvolvidas e os conteúdos das disciplinas alinhados às ferramentas tecnológicas. O resultado desse processo será a aproximação de alunos e docentes com as tecnologias, com os ambientes digitais, por conseguinte, torna-se possível ampliar a comunicação e a interação, além de viabilizar a reflexão teórica e prática (ARAÚJO, 2013).

O desenvolvimento de tecnologias digitais de aprendizagem tem despertado a oferta dos cursos a distância, facilitando, assim, a aprendizagem dos alunos que não podem frequentar os cursos presenciais. Mesmo que os ambientes digitais tenham potencial para a disseminação dos conteúdos ensinados, é importante estabelecer uma prática pedagógica humanizada, com acolhimento aos alunos, de modo a fortalecer a interação entre aluno e docente. Nesse contexto, há contribuições significativas para “[...] a nova geração de bibliotecários e bibliotecárias, especialmente diante de uma sociedade em profundas transformações” (VALLS; SANTIAGO; RODRIGUES, 2020, p. 104).

Portanto, a ressignificação do fazer docente na universidade é necessária, pois envolve dimensões e responsabilidades próprias da docência universitária, considerando o contexto de vida a que os envolvidos estão inseridos, o que confere à prática educativa o envolvimento com saberes múltiplos e interligados (CUNHA, 2019). No âmbito da docência em Biblioteconomia, como afirmado por Santa Anna (2018), é preciso conhecer os fundamentos que sustentam a prática educativa, tanto no aspecto técnico-profissional quando no aspecto pedagógico. 

 

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

 

Caracteriza-se este estudo como descrito, pois são discutidas informações que evidenciam a realidade do docente de Biblioteconomia, além da descrição acerca dos princípios freireanos e as atitudes que eles oportunizam. O estudo é qualitativo, pois os resultados alcançados originam-se a partir de dados não quantificáveis, com o uso de comparações, inferências e proposições.

Quanto aos procedimentos técnicos, adota-se a pesquisa bibliográfica e a análise de conteúdo; essa foi realizada na obra de Paulo Freire e aquela em artigos que versam sobre a docência em Biblioteconomia e foram publicados em periódicos. A partir desses procedimentos, foram estabelecidas três etapas para constituição dos resultados, sendo que, em cada uma delas, atingiu-se um resultado específico (produto), conforme apresentado na Figura 1.

Figura 1 – Etapas dos processos metodológicos

Fonte: Elaborada pelo autor (2021).

A partir da Figura 1, identifica-se que as três etapas da metodologia estão associadas na busca pelo resultado final do estudo. Com o término da pesquisa bibliográfica e da análise de conteúdo, a terceira etapa (correlação) foi acrescentada como complementação das etapas anteriores e utilizando técnicas de categorização. Logo, percebe-se que as duas primeiras etapas são independentes, ao passo que a terceira dependeu dos resultados das anteriores.

Na pesquisa bibliográfica, os artigos foram selecionados a partir da consulta à base de dados do Google Acadêmico, com uso da expressão “Docência Universitária em Biblioteconomia”. O produto dessa etapa foi a identificação dos principais desafios e expectativas que permeiam o fazer docente na Graduação em Biblioteconomia. Isso quer dizer que dos textos foram extraídas informações sobre o que os docentes realizam para garantir o ensino-aprendizagem dos discentes nas disciplinas que ministram, os problemas que enfrentam e as estratégias ou percepções acerca da sua prática educativa.

Na análise de conteúdo, foram selecionadas três obras de Paulo Freire (livros), a saber: Educação e Mudança (FREIRE, 2005), Pedagogia da Autonomia (FREIRE, 2009) e Política e Educação (FREIRE, 2001). A escolha dessas obras se justifica por elas mencionarem princípios que geram condutas ou comportamentos de natureza humana, social e democrática, como pontuado em estudos anteriores publicados, a saber: Almeida (2019), Lima e Braga (2016), Saul e Saul (2016), dentre outros. Os princípios humanos, sociais e democráticos (caracterizados como as categorias de análise), além de representarem a pedagogia freireana, também abordam, de modo integral, as contribuições da prática educativa, em diferentes âmbitos. O resultado dessa etapa foi o conhecimento sobre os princípios freireanos e as atitudes que eles possibilitam.

Na correlação, os resultados das duas etapas anteriores foram comparados, de modo que fosse possível atingir o objetivo final do estudo, ou seja, identificar a aplicação dos princípios postulados por Paulo Freire no fazer do docente de Biblioteconomia. Nesse processo, foi analisado se os princípios humanos, sociais e democráticos estavam alinhados ao que o docente de Biblioteconomia tem aplicado em sala de aula, ou o que ele, seja em termos de dificuldades ou expectativas, considera acerca da docência exercida para os discentes de Biblioteconomia.

Os resultados obtidos com a etapa da correlação possibilitaram elucidar algumas proposições que possam fortalecer o fazer dos docentes, tendo em vista garantir maior contribuição da docência para com o exercício do bibliotecário, cujo padrão comparativo utilizado foi os princípios freireanos. Entende-se que essas recomendações evidenciadas poderão fornecer insumos prévios na garantia de que o fazer docente não seja, tão somente, técnico, ou seja, que o docente, em seu dia a dia de trabalho, desenvolva habilidades técnico-pedagógicas, por meio da fusão entre conhecimento bibliotecário e pedagógico.

 

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

Com o propósito de descrever a realidade da prática docente no contexto dos cursos de Biblioteconomia, a partir de trabalhos publicados na literatura, percebeu-se que os estudos apresentaram resultados distintos, mas convergentes. Os resultados alcançados com a pesquisa bibliográfica são apresentados, de modo sintetizado, no Quadro 1.

Quadro 1 – Resultados dos estudos analisados - síntese

A realidade do fazer docente (desafios e expectativas)

Citação (autor/ano)

Necessidade de conhecimento de disciplinas técnicas

Araújo e Leal (2012) e Lourenço et al. (2020)

Sugestão do uso de visitas técnicas

Santa Anna (2019)

Importância da inovação em sala de aula

Bernardi e Ramos (2020) e Diniz e Rocha (2013)

Participação em projetos universitários

Bernardi e Ramos (2020) e Eggert-Steindel (2002)

Uso da pesquisa no ensino

Jesus e Silva (2011) e Santa Anna (2020)

Importância da aplicação do conhecimento na sociedade

Jesus e Silva (2011), Lourenço et al. (2020) e Santa Anna (2020)

Uso das tecnologias digitais e necessidade de conhecê-las

Araújo (2013), Ferreira (2000) e Valls, Santiago e Rodrigues (2020)

Adoção de atitudes e comportamentos individuais e coletivos como: diálogo, respeito, interação, participação, motivação, dentre outros

Bernardi e Ramos (2020), Santa Anna (2020) e Valls, Santiago e Rodrigues (2020)

Fonte: Dados da pesquisa (2021).

 

A análise dos artigos que versam sobre docência universitária exercida na Graduação em Biblioteconomia revelou que o fazer docente precisa estar em constante aprimoramento (EGGERT-STEINDEL, 2002; SANTA ANNA, 2020), cujas disciplinas precisam representar a prática bibliotecária, sobretudo os processos técnicos que permeiam a organização da informação (LOURENÇO et al., 2020). Portanto, um dos principais desafios apresentados na prática docente diz respeito ao conhecimento técnico exigido no fazer do bibliotecário, conhecimento esse que exigirá especialização do docente (ARAÚJO; LEAL, 2012), além do uso de demonstrações da prática, tal como a realização de visitas técnicas in loco (SANTA ANNA, 2019).

Além da falta de conhecimento técnico, a adoção de estratégias inovadoras por parte do docente é outro desafio a ser superado (BERNARDI; RAMOS, 2020; DINIZ; ROCHA, 2013). Para isso, faz-se necessária a reflexão das atividades pedagógicas oferecidas, de modo que sejam ofertados outros métodos de ensino que visem à reflexão sobre a própria prática, “[...] além de pensar na construção de novos conhecimentos ao invés de reproduzir o que já foi feito [...]” (DINIZ; ROCHA, 2013, p. 127). Nesse processo, destaca-se o envolvimento do docente com projetos que vão além da sala de aula, como os projetos de extensão (EGGERT-STEINDEL, 2002) e a construção de novas disciplinas, mediante uma relação dialógica firmada com docentes e alunos, em especial da Pós-Graduação (BERNARDI; RAMOS, 2020).

Trabalhar o senso crítico do aluno é uma alternativa apontada em alguns estudos, sobretudo quando se utiliza a pesquisa como um método de ensino na Graduação (JESUS; SILVA, 2011; SANTA ANNA, 2018). Por meio do trabalho de investigação como metodologia de ensino, o aluno torna-se capaz de se aproximar dos métodos científicos, desenvolvendo habilidades que estimulem a criatividade, por conseguinte, possibilitam a formulação de respostas aos desafios da sociedade (JESUS; SILVA, 2011; SANTA ANNA, 2020). Assim, o ensino pela pesquisa e a construção coletiva do conhecimento “[...] são estratégias pedagógicas viáveis, haja vista alcançar o processo de ensino-aprendizagem [...]”, sobremaneira, no contexto da Biblioteconomia, que habilita o profissional ao processo de busca, seleção e recuperação de fontes de informação confiáveis (SANTA ANNA, 2018, p. 70).

A tecnologia surge como um potencial para a docência em Biblioteconomia, em virtude de possibilitar a criação de ambientes de compartilhamento, embora esse potencial exija a ressignificação do fazer docente (ARAÚJO, 2013), que coloca aluno e professor como agentes ativos na produção do conhecimento, em uma relação mútua (FERREIRA, 2000). Mesmo com os ambientes digitais de aprendizagem e com a oferta das disciplinas e do próprio curso no ambiente digital, o papel do docente é de mediação, considerando atitudes humanas, como: acolhimento, diálogo e interação (VALLS; SANTIAGO; RODRIGUES, 2020), o que resultará, nos alunos, comportamentos que auxiliem o aprendizado, como: engajamento, satisfação, motivação e comprometimento (SANTA ANNA, 2020).

A análise às obras de Paulo Freire possibilitou identificar que a prática docente se sustenta na fusão entre a identidade individual do sujeito, o meio coletivo e a capacidade de transformação desse meio (FREIRE, 2001, 2005, 2009). Para o autor, a educação é feita por e para humanos, e isso implica que:

somente um ser que é capaz de sair de seu contexto, de “distanciar-se” dele para ficar com ele; capaz de admirá-lo para, objetivando-o, transformá-lo e, transformando-o, saber-se transformado pela sua própria criação; um ser que é e está sendo no tempo que é o seu, um ser histórico, somente este é capaz, por tudo isto, de comprometer-se (FREIRE, 2005, p. 8).

 

A prática pedagógica, na visão do autor, tem como núcleo central a produção de conhecimento que viabiliza compromisso de mudança com a realidade. Portanto, o conhecimento é ampliado quando docente e aprendiz compartilham conhecimento, ou seja, essa produção acontece em “via-dupla”, cujo fazer docente terá como premissa a estratégia do ensinar-aprendendo, o que exige, nesse processo, determinados valores humanos, como: respeito, diálogo, reconhecimento, valorização e liberdade (FREIRE, 2009).

Ao valorizar a individualidade do sujeito e a sua liberdade, será promovido um fazer docente emancipatório (FREIRE, 2009); ao estimular o compartilhamento do conhecimento visando à transformação, os resultados serão refletidos na mudança do meio ou contexto de vida do sujeito (FREIRE, 2005). Com efeito, ao apoiar-se nesses dois pilares, a educação assume um compromisso com a igualdade de direitos, despertando a luta por melhores condições de vida, cujo próprio ser humano é o agente que controla esse processo. Logo, educação implica no exercício da cidadania, na valorização da democracia, no compromisso de buscar a igualdade social e no envolvimento político (FREIRE, 2001).

A partir da síntese às três obras analisadas, foi possível perceber que as reflexões propostas por Freire elucidam os princípios sociais (FREIRE, 2005), humanos (FREIRE, 2009) e democráticos (FREIRE, 2001). Esses princípios vão evocar atitudes e comportamentos específicos nos que participam do processo educativo. O Quadro 2 resume os princípios freireanos e as atitudes que eles provocam em docentes e alunos.

Quadro 2 – Princípios sociais, humanos e democráticos e as atitudes que evocam no processo educativo

Princípios

Principais atitudes

Citação

 

 

 

 

 

 

Sociais

Compromisso

“[...] O compromisso, próprio da existência humana, só existe no engajamento com a realidade, de cujas ‘águas’ os homens verdadeiramente comprometidos ficam ‘molhados’, ensopados. Somente assim o compromisso é verdadeiro. Ao experienciá-lo, num ato que necessariamente é corajoso, decidido e consciente, os homens já não se dizem neutros [...]” (FREIRE, 2005, p. 9).

Mudança social

“[...] A educação, portanto, implica uma busca realizada por um sujeito que é o homem. O homem deve ser o sujeito de sua própria educação. Não pode ser o objeto dela. Por isso, ninguém educa ninguém” (FREIRE, 2005, p. 14).

Conscientização

“Há uma pluralidade nas relações do homem com o mundo, na medida em que o homem responde aos desafios deste mesmo mundo, na sua ampla variedade; na medida em que não se esgota num tipo padronizado de resposta” (FREIRE, 2005, p. 35).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Humanos

Autonomia

“Posso saber Pedagogia, Biologia como Astronomia [...]. Sou gente. Sei que ignoro e sei que sei. Por isso, tanto posso saber o que ainda não sei como posso saber melhor o que já sei. E saberei tão melhor e mais autenticamente quanto mais eficazmente construa a minha autonomia em respeito às dos outros” (FREIRE, 2009, p. 37).

Compartilhamento

“[...] Ensinar não é transmitir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção. Quando entro em sala de aula devo ser um ser aberto a indagações, curiosidade, a perguntas dos alunos, a suas inibições [...]” (FREIRE, 2009, p. 21).

Diálogo e respeito

“[...] O diálogo em que se vai desafiando o grupo popular a pensar sua história social como a experiência igualmente social de seus membros, vai revelando a necessidade de superar certos saberes que, desnudados, vão mostrando sua ‘incompetência’ para explicar os fatos” (FREIRE, 2009, p. 32).

Criticidade

“[...] Não haveria criatividade sem a curiosidade e a criticidade que nos movem e nos põem pacientemente impacientes diante do mundo que não fizemos, acrescentando a ele algo que fazemos” (FREIRE, 2009, p. 15).

Pesquisa

“Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses fazeres se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino, continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Preciso para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade” (FREIRE, 2009, p. 14).

 

 

 

 

 

 

 

 

Democráticos

Cidadania

“[...] Cidadão significa indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um Estado e que cidadania tem que ver com a condição de cidadão, quer dizer, com o uso dos direitos e o direito de ter deveres de cidadão” (FREIRE, 2001, p. 25).

Participação

“[...] Fazendo educação numa perspectiva crítica, progressista, nos obrigamos, por coerência, a engendrar, a estimular, a favorecer, na própria prática educativa, o exercício do direito à participação por parte de quem esteja direta ou indiretamente ligado ao que fazer educativo” (FREIRE, 2001, p. 34).

Diversidade

“[...] O educador progressista entende que qualquer reducionismo de classe, de sexo, de raça, distorce o sentido da luta, pior ainda, reforçando o poder dominador, enfraquece o combate. Por isso mesmo a sua é a defesa em favor da invenção da unidade na diversidade” (FREIRE, 2001, p. 46).

Responsabilidade social

“O direito de ser tratados com dignidade pela organização para a qual trabalhamos, de ser respeitados como gente. O direito a uma remuneração decente. O direito de ter, finalmente, reconhecidos e respeitados todos os direitos que nos são assegurados pela lei e pela convivência humana e social” (FREIRE, 2001, p. 44).

Fonte: Dados da pesquisa (2021).

                                                               

Contextualizando o Quadro 2 com a prática educativa, infere-se que o docente tem uma bagagem conceitual que, por sua vez, despertará inúmeros apontamentos para melhorar a sua práxis pedagógica. As estratégias que o docente pode utilizar para tornar suas aulas mais participativas, sustentadas em princípios humanos, sociais e democráticos, são variadas, e essa aplicação pode ocorrer em qualquer segmento educacional, em diferentes instituições, vinculadas a diversas áreas do conhecimento, como pontuado por Gadotti (2005). Nesse contexto, a sala de aula não é mais o lócus da educação e os docentes rompem os muros das instituições, ou seja, invadem hoje as ruas, saem da escola, “[...] lutando por melhores condições de ensino e de salário, certo de que, assim fazendo, estão também fortalecendo a categoria e transformando a sociedade civil numa sociedade mais resistente à dominação” (GADOTTI, 2005, p. 5).

Considerando que os princípios freireanos representam uma referência para o fortalecimento da educação, sobretudo ao romper o modelo tradicional de ensino, elegendo um modelo libertador/emancipatório (FONTANELLA; BITTENCOURT, 2018; MACIEL, 2011), depreende-se que esses princípios podem embasar a prática docente nos cursos de Graduação em Biblioteconomia, como recomendado no estudo de Santa Anna (2018). Com efeito, a realidade do fazer docente nessa área de conhecimento, conforme levantado na pesquisa bibliográfica, possibilita identificar a prática desses princípios no contexto em análise, conforme descrito no Quadro 3.

Quadro 3 – Correlação entre princípios freireanos e a realidade do fazer docente na Biblioteconomia

A realidade do fazer docente (desafios e expectativas)

Princípios

Principais atitudes

Necessidade de conhecimento de disciplinas técnicas

 

 

 

 

Sociais

 

Compromisso

 

 

Mudança social

 

 

Conscientização

Sugestão do uso de visitas técnicas

Importância da inovação em sala de aula

Participação em projetos universitários

Uso da pesquisa no ensino

Importância da aplicação do conhecimento na sociedade

Uso das tecnologias digitais e necessidade de conhecê-las

Adoção de atitudes e comportamentos individuais e coletivos como: diálogo, respeito, interação, participação, motivação, dentre outros

 

 

 

 

 

Humanos

Autonomia

 

Compartilhamento

 

Diálogo e respeito

 

Criticidade

 

Pesquisa

Importância da inovação em sala de aula

 

Uso da pesquisa no ensino

XXX

 

 

Democráticos

Cidadania

XXX

Participação

XXX

Diversidade

XXX

Responsabilidade social

Legenda: XXX indica que não houve correlação

Fonte: Dados da pesquisa (2021).

 

O Quadro 3 revela que os princípios freireanos estão tendo correlação com a realidade que permeia o fazer docente nos cursos de Biblioteconomia, de acordo com os trabalhos analisados na pesquisa bibliográfica deste estudo, com predominância dos princípios sociais, seguidos dos princípios humanos. Os princípios sociais são abordados pelos docentes de Biblioteconomia quando utilizam estratégias de ensino que despertem a visibilidade do fazer profissional e sua aplicação na sociedade, ou seja, à medida que o docente congrega teoria e prática, abordagem essa que pode ser mediada com tecnologias digitais, mediante a oferta de encontros síncronos e assíncronos (VALLS; SANTIAGO; RODRIGUES, 2020).

O ensino de Biblioteconomia é indissociável da sociedade, visto que os bacharéis irão atuar em diferentes segmentos de mercado, cabendo, portanto, no decorrer de sua formação, que sejam adotadas estratégias de ensino que demonstrem o valor da prática profissional para a sociedade (FERREIRA, 2000; JESUS; SILVA, 2011; SANTA ANNA, 2019). Sendo assim, a prática docente irá despertar a consciência nos alunos de que “[...] esse novo profissional [o bibliotecário] precisa dar conta dessa nova demanda que exige que ele esteja inserido no contexto da informação, da produção de novos conhecimentos e uso das novas tecnologias” (JESUS; SILVA, 2011, p. 3).

Acerca dos princípios humanos, percebeu-se que muitos comportamentos permeiam as salas de aula, nos dias atuais, tais como: autonomia, compartilhamento, diálogo e respeito, criticidade e pesquisa. Essas atitudes se manifestam, sobremaneira, quando o docente reinventa a sala de aula, com uso de estratégias inovadoras, haja vista despertar a atenção e maior envolvimento dos alunos, como destacado no estudo de Araújo (2013) e Santa Anna (2018).

Freire (2009) revelou que a interação aluno e docente não é mais rígida e linear; ao contrário, precisa ser recíproca, a ponto de promover a autonomia do sujeito, o que ampliará a produção do conhecimento. Isso se manifesta, em especial, segundo o autor, quando se trabalha a pesquisa na sala de aula, cujo docente atua como mediador, que provoca o interesse investigativo do aluno. O estudo de Santa Anna (2018) constatou essa afirmação, ao identificar que o ensino pela pesquisa, “[...] aliado ao diálogo e ao compartilhamento de conhecimento, bases da filosofia freireana, despertou inúmeras condutas ao alunado, como: empenho, participação intensa, motivação, interesse e interação” (SANTA ANNA, 2018, p. 70).

No que tange aos princípios democráticos, não foi constatada correlação, o que evidencia que eles precisem ser trabalhados pelos docentes, haja vista complementar os princípios sociais, despertando em alunos e docentes a preocupação com a igualdade de direitos, a democracia e o respeito à diversidade, o que evidencia compromisso e envolvimento político (FREIRE, 2001). Almeida Júnior (1997) já havia constatado pouco envolvimento político do bibliotecário, constatação essa que pode ser levada para as salas de aula, de modo que a docência possa estimular essa participação.

Muitos relatos da literatura reforçam a importância do envolvimento do bibliotecário com as causas sociais, sobretudo com a construção da cidadania como no estudo de Morigi, Vanz e Galdino (2002) e Duarte (2018). Para Morigi, Vanz e Galdino (2002), “[...] o bibliotecário é uma peça importante para o conjunto social na construção da aprendizagem cidadã [...]”. Para tanto, a sua ação “[...] deve ser pautada em valores democráticos, solidários e de responsabilidade em relação ao planeta, considerando também o enraizamento de sua identidade nacional [...]” (MORIGI; VANZ; GALDINO, 2002, p. 145). Na visão de Duarte (2018), é compromisso das bibliotecas e dos bibliotecários assegurarem o domínio público, a diversidade, a pluralidade e a igualdade de todos os setores da população, rompendo qualquer tipo de discriminação.

A partir da constatação de que não há princípios democráticos na docência, e de que a realidade social do bibliotecário evoca essa necessidade, reforça-se a importância dessa discussão durante o percurso formativo do profissional. O estudo de Jesus e Silva (2011), ao investigar a importância da pesquisa durante o ensino da Graduação em Biblioteconomia, revelou que o envolvimento político e social é escasso no percurso formativo, porém, “[...] a sociedade exige que profissionais cada vez mais sejam aptos para atuar sobre a realidade e intervir nela a fim de resolver as questões de nossa época” (JESUS; SILVA, 2011, p. 1, grifo nosso).

Após a etapa da correção, como resultado da comparação entre os princípios freireanos e a realidade do fazer docente no curso de Biblioteconomia, foi possível estabelecer algumas recomendações para o fortalecimento desse fazer. O Quadro 4 sintetiza essas indicações, as quais foram obtidas com os resultados das correlações e com evidências da literatura consultada.

Quadro 4 – Algumas recomendações para o fortalecimento do fazer docente

Princípios

Principais atitudes

Algumas recomendações

 

 

 

 

 

 

 

Sociais

 

 

 

 

 

Compromisso

 

 

Mudança social

 

 

Conscientização

- Participação do docente em cursos de capacitação sobre processos técnicos em Biblioteconomia.

- Utilização de visitas técnicas em bibliotecas e outros setores da sociedade que aplicam os processos técnicos da Biblioteconomia.

- Criar metodologias variadas de ensino, não se prendendo, apenas, à teoria.

- Vinculação das atividades realizadas nas disciplinas em projetos de extensão, iniciação científica, dentre outros.

- Valorizar a pesquisa como principal método de aprendizagem.

- Formar parcerias com instituições para aplicar conhecimentos técnicos ensinados nas aulas.

- Participar em cursos de capacitação no uso de tecnologias.

- Explorar os recursos dos ambientes digitais de aprendizagem.

- Motivar os alunos à criação de empresas juniores, a partir de diferentes campos de atuação do bibliotecário, como: normalização, consultora em gestão da informação, catalogação, dentre outros.

 

 

 

 

 

 

Humanos

 

 

 

Autonomia

 

Compartilhamento

 

Diálogo e respeito

 

Criticidade

 

Pesquisa

- Desenvolver um ambiente colaborativo na sala de aula.

- Garantir o respeito, diálogo e interação no ambiente da sala de aula.

- Respeitar os pontos de vista dos alunos, considerando o contexto a que estão inseridos, as particularidades de cada um quanto ao modo de aprender e a diversidade cultural.

- Utilizar estratégias que despertem a participação dos alunos, como seminários, rodas de conversas, palestras, dentre outras.

- Utilizar recursos variados de ensino, de modo que as aulas fiquem menos cansativas e mais atrativas.

- Provocar os alunos, não apresentando respostas imediatas, mas estimulando-os a indagar, pesquisar e compartilhar.

- Adotar estratégias de avaliação criteriosas, críticas e contínuas, estimulando o senso crítico dos alunos.

- Ampliar os métodos de avaliação, não se prendendo à aplicação de provas pautadas em índices quantitativos.

 

 

 

 

 

 

 

Democráticos

 

 

 

 

Cidadania

 

Participação

 

Diversidade

Responsabilidade social

- Criação de projetos sociais voltados à garantia da igualdade de direitos para todas as classes sociais.

- Envolver as atividades curriculares com a preservação do meio ambiente e a questão da sustentabilidade.

- Estabelecer atividades que contemplem os objetivos do desenvolvimento sustentável, conforme preconizado pela Agenda 2030 da ONU.

- Estimular a participação dos alunos no movimento estudantil universitário.

- Despertar o espírito político dos alunos, mediante projetos firmados com partidos e outros órgãos públicos ligados à democracia.

- Estimular, durante as atividades curriculares, o desenvolvimento crítico de projetos voltados para as causas sociais, como: igualdade de gêneros, respeito às diferenças culturais, raciais e ideológicas.

- Criar projetos de pesquisa e/ou extensão que defendam os vários segmentos que compõem a ampla diversidade social brasileira.

Fonte: Dados da pesquisa (2021).

 

As evidências deste estudo confirmam a importância de se adotar os princípios freireanos na docência em Biblioteconomia, visto que eles poderão estimular a criatividade do docente, haja vista garantir uma aprendizagem que tenha sentido para os alunos e para a sociedade. A diversidade de ideias que aflora dos princípios, conforme apontado no Quadro 4 e reforçado ao longo do percurso metodológico, indica que a prática educativa no curso de Graduação em Biblioteconomia será fortalecida, com benefícios para docentes e para a categoria bibliotecária, visto que a profissão tende a se tornar mais visível e reconhecida pela sociedade.

 

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Com o propósito de identificar a aplicação dos princípios postulados por Paulo Freire no fazer do docente de Biblioteconomia, foram aplicados três métodos de pesquisa. A partir do levantamento da literatura, percebeu-se que há preocupação em fundir teoria e prática nas estratégias de ensino, sem menosprezar valores comportamentais que enaltecem a motivação. A análise às obras freireanas revelou a existência de princípios e atitudes de natureza humana, social e democrática. Por fim, ao correlacionar esses resultados, foi possível revelar a importância da adoção dos princípios na garantia do aprimoramento da prática docente e do fazer do bibliotecário.

Os resultados indicaram que a prática docente recorre aos princípios sociais e humanos, não sendo explorados os princípios democráticos. Por essas evidências, percebeu-se a necessidade da adoção de estratégias pedagógicas que possibilitem uma educação mais crítica, emancipatória e interventiva, de modo a encorajar o bibliotecário ao exercício profissional e fortalecer o reconhecimento e atuação da Biblioteconomia na sociedade. Percebeu-se que os três princípios são importantes e que, ao não valorizar os princípios democráticos, perde-se a oportunidade de estimular o senso crítico do bibliotecário, seu compromisso com a igualdade de direitos, a defesa da cidadania e o envolvimento político, haja vista a construção de uma sociedade mais justa, democrática, inclusiva e igualitária.

O estudo em epígrafe ofereceu uma reflexão inicial com o propósito de ampliar a discussão sobre o desenvolvimento de estratégias pedagógicas durante o ensino de Biblioteconomia nas universidades. A quantidade limitada de estudos levantados da literatura sobre a docência universitária e a ausência da análise a dados empíricos do cotidiano constituem as principais limitações do estudo. Por isso, ampliar a quantidade de artigos analisados e realizar entrevistas a docentes sobre a adoção dos métodos de ensino utilizados são algumas sugestões de pesquisas a serem desenvolvidas no futuro.

Ensino universitário e Educação são elementos indissociáveis e vinculados à sociedade. Do mesmo modo, o ensino de Graduação em Biblioteconomia também está associado à Educação e à sociedade, embora esse ensino, sobretudo nos cursos de bacharelado, nem sempre é sustentado por princípios educativos. Portanto, não se cessa a necessidade de refletir sobre as contribuições dos princípios educativos para o fortalecimento da prática técnico-pedagógica adotada no percurso formativo dos bibliotecários.

 

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