Revisão de literatura sobre as principais técnicas de
compartilhamento do conhecimento tácito no contexto da gestão do conhecimento nas empresas

 

Literature review on the main techniques of tacit knowledge sharing in the context of knowledge management in companies

 

Revisión de la literatura sobre las principales técnicas para compartir el conocimiento tácito en el contexto de la gestión del conocimiento en las empresas

 

Josceline Lira

Universidade Federal de Pernambuco (PPGCI-UFPE)

Brasil

 

Bruno Tenório Ávila

Universidade Federal de Pernambuco (PPGCI-UFPE)

Brasil

 

 

 

Submetido em: 24/04/2021

Aceito em: 14/06/2021

Publicado em: 28/10/2021

 

Licença:

 

 

Autor para correspondência: Josceline Lira

Email: liraxl.joy@gmail.com

ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4274-3286

 

Como citar este artigo:

LIRA, Josceline; ÁVILA, Bruno Tenório. Revisão de literatura sobre as principais técnicas de compartilhamento do conhecimento tácito no contexto da gestão do conhecimento nas empresas. REBECIN, São Paulo, v. 8, número especial, p. 01-12, 2021. DOI:  10.24208/rebecin.v8i.261

RESUMO

 

O conhecimento tácito é o conhecimento pessoal e específico a determinado contexto, porém, pode extrapolar os limites do nível individual para ser assimilado e incorporado ao nível coletivo e, consequentemente, organizacional, por meio da articulação deste conhecimento. O objetivo deste trabalho é revisar a literatura sobre as principais técnicas de compartilhamento do conhecimento tácito no contexto da gestão do conhecimento nas empresas. A metodologia da pesquisa engloba pesquisa exploratória de natureza qualitativa. Quanto aos procedimentos de coleta de dados, é caracterizada como pesquisa bibliográfica, cuja fonte bibliográfica é a Web of Science. A discussão desenvolvida na revisão de literatura está estruturada em quatro eixos temáticos do compartilhamento de conhecimento: ambiente organizacional, ferramentas, métodos e modelo, os quais ilustram o que os gestores devem saber e fazer para realizar o compartilhamento do conhecimento tácito nas empresas. Os resultados indicam que os contatos pessoais entre as equipes de trabalho proporcionam a aprendizagem informal e permitem que o conhecimento tácito de cada funcionário seja transformado em conhecimento organizacional. Assim, as técnicas de compartilhamento do conhecimento tácito revisadas neste artigo são baseadas na interação social e também têm apoio das soluções da tecnologia da informação que suportam tais interações e aumentam a disponibilização e registro do conhecimento.

 

Palavras-Chave: Conhecimento tácito; Compartilhamento de conhecimento; Gestão do Conhecimento; Empresas; Organizações.

 

ABSTRACT

 

Tacit knowledge is personal and specific knowledge to a certain context, however, it can extrapolate the limits of the individual level to be assimilated and incorporated at the collective and therefore organizational level through the articulation of this knowledge. The objective of this paper is to review the literature on the main techniques of tacit knowledge sharing in the context of knowledge management in companies. The research methodology encompasses exploratory research of a qualitative nature. As for the data collection procedures, it is characterized as a bibliographic search, whose bibliographic source is the Web of Science. The discussion developed in the literature review is structured in four thematic axes of knowledge sharing: organizational environment, tools, methods, and model, which illustrate what managers must know and do to accomplish the sharing of tacit knowledge in companies. The results indicate that personal contacts between work teams provide informal learning and allow the tacit knowledge of each employee to be transformed into organizational knowledge. Thus, the tacit knowledge sharing techniques reviewed in this article are based on social interaction and also supported by information technology solutions that support such interactions and increase the availability and registration of knowledge.

 

Keywords: Tacit knowledge; Knowledge sharing; Knowledge management; Companies; Organizations.

 

RESUMEN

 

El conocimiento tácito es un conocimiento personal que es específico de un determinado contexto; sin embargo, puede sobrepasar los límites del nivel individual para ser asimilado e incorporado al nivel colectivo y, en consecuencia, organizativo mediante la articulación de este conocimiento. El objetivo de este estudio es revisar la literatura sobre las principales técnicas de intercambio de conocimiento tácito en el contexto de la gestión del conocimiento en las empresas. La metodología de la investigación comprende una investigación exploratoria de carácter cualitativo. En cuanto a los procedimientos de recogida de datos, se caracteriza por ser una investigación bibliográfica, cuya fuente bibliográfica es la Web of Science. La discusión desarrollada en la revisión bibliográfica se estructura en cuatro ejes temáticos del intercambio de conocimientos: entorno organizativo, herramientas, métodos y modelo, que ilustran lo que los directivos deben saber y hacer para lograr el intercambio de conocimientos tácitos en las empresas. Los resultados indican que los contactos personales entre los equipos de trabajo proporcionan un aprendizaje informal y permiten que el conocimiento tácito de cada empleado se transforme en conocimiento organizativo. Así pues, las técnicas de intercambio de conocimientos tácitos que se examinan en este artículo se basan en la interacción social y se apoyan también en soluciones informáticas que respaldan dichas interacciones y aumentan la disponibilidad y el registro de los conocimientos.

 

Palabras clave: Conocimiento tácito; intercambio de conocimientos; gestión del conocimiento; empresas; organizaciones.

 

1 INTRODUÇÃO

 

No decorrer do desenvolvimento das atividades de uma empresa, os funcionários podem gerar ou adquirir novos conhecimentos, que surgem das demandas do trabalho realizado naquele ambiente e das pessoas investidas em cargos e funções daquela empresa (MIRVIS et al., 2016; NONAKA; TAKEUCHI, 1997; PARK; VERTINSKY, 2016). Em especial, alguns funcionários desenvolvem um jeito particular de desempenhar a mesma tarefa que os demais, porém, conseguem resultados melhores. Este tipo de conhecimento é difícil de ser identificado por quem não o detém e difícil de ser explicado pelo detentor porque está enraizado em sua personalidade (BALCONI; POZZALI; VIALE, 2007). Esta forma de conhecimento denomina-se conhecimento tácito. Explorado inicialmente por Michael Polanyi, em sua obra The Tacit Dimension, na qual refletiu sobre a possibilidade de externalizar o conhecimento tácito (POLANYI, 2009).

O compartilhamento permite que o conhecimento tácito transpasse os limites da mente do detentor, seja assimilado por outros funcionários e, consequentemente, seja integrado à empresa (MIRVIS et al., 2016; NONAKA; TAKEUCHI, 1997; PARK; VERTINSKY, 2016; ZHU; ZHANG; JIN, 2016). Para isto, diversas técnicas para acessar e capturar o conhecimento tácito no ambiente organizacional foram propostas. Assim, este artigo apresenta uma síntese da revisão da literatura sobre as principais técnicas de compartilhamento do conhecimento tácito nas empresas, que é baseada no trabalho de Lira (2019).

 

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

 

Nonaka e Takeuchi (1997, p. 65) definem o conhecimento tácito como um conhecimento “[...] pessoal, específico ao contexto e, assim, difícil de ser formulado e comunicado”. Esta definição pode ser acrescentada pela ideia de Chuang, Jackson e Jiang (2016, p. 531, tradução nossa), que caracterizam o conhecimento tácito como “[...] mais complexo, ambíguo, e subjetivo; é acumulado pelas pessoas através de observação, imitação, e interações repetidas [...]”. Já o conhecimento explícito “[...] ou ‘codificado’ refere-se ao conhecimento transmissível em linguagem formal e sistemática” (NONAKA; TAKEUCHI, 1997, p. 65). O conhecimento tácito pode se aproximar do conhecimento explícito quando é revelado, articulado.

À vista disso, Nonaka e Takeuchi (1997) desenvolveram um modelo para a criação de conhecimento organizacional. Neste modelo, o conhecimento pode estar nos níveis individual, grupal, organizacional ou interorganizacional; e pode ser do tipo tácito ou explícito. A situação ideal para que as empresas consigam bom desempenho na criação do conhecimento é a que o conhecimento se movimente, ininterruptamente, do indivíduo para o grupo, do grupo para a empresa, da empresa para fora da empresa; e também na direção inversa. Por meio deste modelo é possível desenvolver maneiras de articular o conhecimento tácito e o tornar visível para a empresa (NONAKA; TAKEUCHI, 1997). Este processo ocorre em quatro fases apresentadas a seguir.

A fase de socialização ocorre quando há a conversão de um conhecimento tácito em um conhecimento tácito. Um caso no qual uma pessoa demonstra a sua técnica de realizar uma tarefa para outra pessoa e esta apreende os detalhes da demonstração e passa a realizar a tarefa conforme foi ensinado é um exemplo de socialização. A fase de externalização ocorre quando há a conversão de conhecimento tácito em um conhecimento explícito. Para ilustrar esta fase, suponha que uma pessoa traduza uma ideia em um esboço para explicá-la a outra pessoa; neste momento ocorre a externalização do conhecimento do detentor por meio do esboço. A fase de combinação ocorre quando há a conversão de um conhecimento explícito em um conhecimento explícito. Um exemplo de combinação é observado quando a documentação de uma solução tecnológica gera um novo documento de patente. A fase de internalização ocorre quando há a conversão de um conhecimento explícito em um conhecimento tácito, como no caso de uma pessoa que se apropria do conteúdo de um manual e passa a praticar, incorporando na sua ação as prescrições registradas naquele documento.

 

3 METODOLOGIA

 

A pesquisa que deu origem à revisão de literatura tem enfoque qualitativo. Quanto aos fins, a pesquisa é exploratória (MARCONI; LAKATOS, 2003, p. 188). Quanto aos procedimentos de coleta dos dados, a pesquisa é bibliográfica (SANTOS, 2006) e tem como fonte a coleção principal da Web of Science, acessada pelo Portal de Periódicos CAPES.

Quanto aos procedimentos metodológicos, a revisão de literatura ocorreu em três passos. Primeiro, uma busca foi realizada na Web of Science em meados de 2019 com o termo de busca tacit e com a cobertura cronológica entre 2015 e 2019. O segundo passo foi a seleção dos artigos a partir de critérios de inclusão e exclusão ao corpus. A conclusão da seleção foi realizada com a leitura de um artigo por vez até reunir 10 artigos. O terceiro passo foi a análise do corpus, que resultou no relato das principais técnicas de compartilhamento do conhecimento tácito no contexto da gestão do conhecimento nas empresas, apresentado a seguir.

 

4 TÉCNICAS DE COMPARTILHAMENTO DO CONHECIMENTO TÁCITO

 

O compartilhamento do conhecimento tácito engloba “[...] a transferência de novos conhecimentos para a equipe e incorporação do novo conhecimento ao repertório comportamental da equipe [...], garantindo que o conhecimento existente flua entre os membros da equipe [...]”. (CHUANG; JACKSON; JIANG, 2016, p. 527, tradução nossa). Para isso, diversas técnicas foram propostas e as principais foram selecionadas para serem revisadas neste trabalho. Elas foram organizadas em quatro categorias: ambiente organizacional, ferramentas, métodos e modelos, que são discutidas a seguir.

 

4.1 Ambiente Organizacional

 

Os estudos relacionados a esta categoria mencionam a facilitação do compartilhamento do conhecimento tácito por contatos pessoais, interação entre equipes e redes sociais. Neste contexto, as soluções da tecnologia da informação (TI) para a gestão do conhecimento tornam-se úteis (DEL GIUDICE; DELLA PERUTA, 2016), pois conseguem agregar aspectos próximos às dimensões humanas em algumas ferramentas. As videoconferências e os fóruns de discussão são exemplos que reproduzem o fluxo de comunicação similar ao das conversas face a face.

Nos contatos pessoais, o fluxo de conhecimento tácito é mais intenso (PARK; VERTINSKY, 2016) e acarreta na aprendizagem (CHUANG; JACKSON; JIANG, 2016) de maneira coletiva (DEL GIUDICE; DELLA PERUTA, 2016), o que promove a harmonização da equipe em uma visão compartilhada (PARK; VERTINSKY, 2016). Assim, as interações são propícias ao compartilhamento do conhecimento e a falta do gerenciamento causa o desperdício de conhecimento, uma vez que ele provavelmente estará presente nas interações, porém não será identificado (MIRVIS et al., 2016).

As demais categorias apresentam técnicas que promovem a comunicação do conhecimento tácito pela articulação e pelo registro – anotação e documentação – e são apresentadas a seguir.

 

4.2 Ferramentas

 

As técnicas desta categoria utilizam soluções de TI para promoverem um ambiente de interação informal (DEL GIUDICE; DELLA PERUTA, 2016).

Tyagi e outros (2015) apresentam conjuntos de ferramentas indicadas para cada etapa de criação de conhecimento pertinente ao trabalho com o conhecimento tácito. A ferramenta selecionada para a etapa de externalização é o relatório A3 (A3 report), que possibilita a representação gráfica e sintetizada do conhecimento.

Para a etapa de internalização, as ferramentas selecionadas por Tyagi e outros (2015) são o relatório A3; a obeya virtual (virtual obeya), que reúne todo o conhecimento desenvolvido pela equipe a ser utilizado na resolução de problemas; e as folhas de verificação (checksheets), que padronizam o conhecimento disponível a ser reutilizado nas tomadas de decisão.

 

4.3 Métodos

 

As técnicas nesta categoria também privilegiam a participação de grupos e a interação pessoal (CHUANG; JACKSON; JIANG, 2016). Para a etapa de socialização, Tyagi e outros (2015) indicam os seguintes métodos: aprendizagem (apprenticeship), que envolve encontros informais; treinamento cruzado de funcionários (employee cross-training), que possibilita a interação entre membros de equipes deslocados para o trabalho em outras equipes; scrum, nas reuniões diárias (daily scrum); PDCA (Plan, Do, Check, Act), nas reuniões de planejamento (plan); e o método 5 porquês, nas interações da equipe para a compreensão do projeto.

Para a etapa de externalização, os métodos selecionados por Tyagi e outros (2015) são: engenheiro chefe (chief engineer), no qual a comunicação do conhecimento ocorre por meio de documentos conceituais; engenharia simultânea baseada em conjunto (set-based concurrent engineering), método no qual ocorre a transformação do conhecimento tácito em estruturas conceituais; curvas de trade-off (trade-off curves), método que engloba a elaboração de relatórios de experiência; e os métodos scrum, PDCA e 5 porquês, para a elaboração da documentação.

Para a etapa de internalização, Tyagi e outros (2015) sugerem os seguintes métodos: 5 porquês, scrum e PDCA, que promovem a aplicação do conhecimento absorvido no desenvolvimento do projeto.

 

4.4 Modelo

 

As técnicas desta categoria adotam modelos para o compartilhamento do conhecimento tácito. Mezghani, Exposito e Drira (2016) definiram um modelo para o gerenciamento do conhecimento tácito de equipes. O modelo tem o objetivo de formalizar, por meio da articulação e do registro, o conhecimento dos especialistas, principalmente pela estruturação do conhecimento em uma plataforma para anotação colaborativa. Pode ser visto como uma tentativa de representação e padronização de uma linguagem comum que ficará armazenada numa plataforma disponível a todos os pertencentes ao âmbito.

 

5 CONCLUSÕES

 

A revisão de literatura apresentou as principais técnicas disponíveis para o compartilhamento do conhecimento tácito no ambiente das empresas. Merece destaque a importância dos contatos pessoais para o compartilhamento deste conhecimento. Esses contatos possibilitam a aprendizagem informal e permitem que o conhecimento tácito seja comunicado às outras pessoas da empresa, assumindo status de conhecimento organizacional. As ferramentas, métodos e modelo reunidos na revisão são baseados na interação social, inclusive com apoio das soluções da TI que suportam interações pessoais mais parecidas com as do mundo físico, como conversas e exibição de vídeos. Assim, a TI também tem papel importante no compartilhamento do conhecimento tácito no tocante à disponibilização e ao registro.

 

REFERÊNCIAS

 

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DEL GIUDICE, M.; DELLA PERUTA, M. R. The impact of it-based knowledge management systems on internal venturing and innovation: a structural equation modeling approach to corporate performance. Journal of Knowledge Management, v. 20, n. 3, p. 484-498, 2016.

 

LIRA, J. Revisão de literatura sobre as principais técnicas de compartilhamento do conhecimento tácito no contexto da gestão do conhecimento nas empresas. 2019. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Gestão da Informação) – Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2019.

 

MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M. Fundamentos de metodologia científica. São Paulo: Atlas, 2003.

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MIRVIS, P.; HERRERA, M. E. B.; GOOGINS, B.; ALBAREDA, L. Corporate social innovation: how firms learn to innovate for the greater good. Journal of Business Research, v. 69, n. 11, p. 5014-5021, nov. 2016.

 

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POLANYI, M. The tacit dimension. Chicago: The University of Chicago Press, 2009.

 

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